segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Entalado entre Henry Kiddle, antigo Superintendente das Escolas Públicas de Nova Iorque, falecido a 25 de Setembro de 1891, e o General George Ernest Jean Marie Boulanger, antigo Ministro da Guerra da França, falecido em Bruxelas a 30 de Setembro de 1891, «o» magazine da editora Harpers publicava em Dezembro de 1891 o seguinte e demorado elogio: Obituary - Sept, 27, In New York City; Herman Melville, aged seventy-three years.

Consciente de que os leitores deste blogue esperam uma reação em conformidade com os lamentáveis óculos de Nuno Camareiro, Camaneiro, digo, Camarneiro, vencedor do prémio Manuel-Alegre-paga-aí-a-minha-tosta-mista, 2012, passo já de imediato ao assunto mais premente do dia, a saber, a celebração mística que ontem por volta das 22 horas e 32 minutos teve lugar no canal 2 da ainda, agora e sempre, mas esperemos que por não muito tempo, Rádio Televisão Angolana, ou seja, o último número do inesquecível magazine cultural, como era mesmo o nome, Câmara Clara. Entre lágrimas e declarações comovidas não pude (é do caralho) assistir ao eloquente e rujubilante auto-elogio de Paula Moura Pinheiro, a Faraoniza do Egipto, uma vez que, lamentavelmente, a essa mesma hora decorria na Sport TV 2 (um escândalo, uma vez que na Sport TV 1 se transmissionava o imponderável Paços de Ferreira-Vitória de Guimarães, Portugal é esta lamentável tragédia, não acrescentemos mais nada) a transmissão diferida da final feminina do Campeonato da Europa de Andebol, Noruega versus Montenegro, e sendo que durante o acontecimento, transmitido em directo à tarde, estava incógnito num lugar remoto do país a procurar compreender os segredos da humanidade em geral bem como a minha atração, aparentemente involuntária, pelo hipnotizante e mortal abismo da beleza.
 
 
Convém clarificar que sou forçado a escrever estas linhas vergado sobre o peso da derrota, depois de ter  sofrido uma comoção celebral ao descobrir ter ficado extremamente abalado na noite de Sábado perante o choque fortuitamente fortuito, no espaço do invisível, a internet, com o deputado do partido comunista português, Miguel Tiago (o gajo das motas, sempre vestido de napa, e alegadamente, segundo o seu perfil na blogosfera, amante das artes marciais, da caça submarina e de música metálica, e considerado Blogger do ano, editando não apenas um blogue mas uma constelação de heterónimos (o "Império Bárbaro", o "Autoridade Nacional", o "Em Código Aberto", para além do colectivo "Kontra Korrente, do qual destacamos o hilariante Em Código Aberto) evento do qual saí a coxear com a seguinte conclusão: Miguel Tiago não é apenas um defensor do povo, Miguel Tiago é uma instituição, sim, caro leitor, uma instituição, cujo recente livro, Letras Ígneas, aí está para testemunhar que a livre iniciativa capitalista e as rodas inexoráveis do mau gosto se revelam mais que nunca imparáveis na sua capacidade trituradora.
 
 
Felizmente, ontem à noite, a final Montenegro-Noruega ultrapassou em expectativa tudo o que pode esperar-se de um momento televisivo: mulheres bonitas para todos os gostos, extraordinariamente competentes em todos os capítulos da sua profissão; dramatismo colectivo, exclusões e controlo morfológico da morfologia em geral; golos de bem efeito; elegância na dificuldade; o protagonismo do crítico underdog, neste caso a melhor marcadora do torneiro Katarina Bulatovic, superiorizando-se à sua aclamada e multi-premiada rival, a fabulosa ponta da noruega, Heidi Loke; um treinador carismático a conduzir a sua equipa como um maestro magneticamente conduz o segundo andamento dos Planetas de Holst; raiva, imaginação e linguagem prodigiosamente contida na corporeidade (o que nos permite dispensar a chatice de ler as obras completas de Gonçalo M. Tavares) e uma edificante e pedagógica eficiácia defensiva de Montenegro, a rondar os 60%, ou seja, a esperada confirmação de que o melhor ataque contra toda a agressividade insultuosa e humilhante das coisas é cerrar os dentes, esticando o corpo e a mente em todas as direções possíveis.
 

Sem comentários: