quinta-feira, 26 de julho de 2012

Os mestres são os que alcançam o dom de serem ultrapassados, desculpem, esta merda parece o Paulo Coelho; é o que dá um gajo tentar explicar as coisas

Se eu fosse o Henrique Raposo começaria este texto invocando a minha experiência neo-realista, onde avulta, nomeadamente, uma tia criada e residente, à moda antiga, em vivenda unifamiliar burguesa nos arvoredos solarengos da Parede, uma mãe despedida de uma fábrica de confeções pronto-a-vestir naquele vendaval histórico que consistiu na generalização dos prazeres sensuais do porco-doce e do frango com amêndoas, e um pai electricista, a quem explodiu um quadro eléctrico de uma fábrica numa inovadora tentativa para potenciar os seus rendimentos monetários através da combustão dos próprios tecidos faciais.

No entanto, nada disto me impede de olhar para a realidade com um sentido de exigência e compaixão. É verdade que por defeito profissional fui treinado para levar o raciocínio para além do que é socialmente aceitável, mas que outros não tenham recebido um treino idêntico não justifica inteiramente que se entreguem a uma espécie de repetição eterna das suas próprias limitações: veja-se o caso de Jorge Jesus ou Joe Berardo, onde cada um, canhestramente e à sua maneira, se desfaz em esforços para falar correctamente a língua portuguesa. Ora, é pegar nesse exemplo e tranportá-lo para o pensamento político: para hipnotizar essa entidade criada pelo século XVIII - a população - com um projecto político novo, é preciso pensar para além dos limites conhecidos, mesmo que isso nos exija uma ética ninja de auto-sacrifício e o manejo de estrela pontiagudas. Se toda esta artilharia moral, imprescindível para o rebetamento dos muros que erguemos à nossa volta para nos defendermos da imprevisibilidade da vida, vos parecer um exercício ridículo e cómico, posso garantir, com auxílio demonstrantivo de toda a comédia clássica e isabelina, que é três vezes mais cómico e ridículo ouvir alguém perorando repetidamente sobre os limites do seu quintal julgando estar a ultrapassar as últimas fronteiras do universo.

Pedro Passos Coelho, após ter rapado o cabelo num barbeiro em Massamá, e questionando os limites da sua incomensurável ignorância, ouve atento as explicações espirituais de Miguel Relvas, depois de este ter ficado cego ao tentar completar a leitura compreensiva de O Príncipe, de Maquiavel


Aqui neste local, o Daniel Oliveira presta-se à demonstração do singelo procedimento da indignação perante os outros, muito habitual nas pessoas bem intencionadas mas com pouco treino nas regiões inóspitas do desconhecido. Desse modo, confunde as percepções dos direitos com os mecanismos que permitem consagrar um determinado direito como legítimo. Não estou com isto a recorrer ao exausto argumento da força das circunstâncias, estou apenas a lembrar que as funcionalidades do dinheiro - para férias, para telémoveis ou para pornografia - dependem de consensos e efeitos de contágio ideológico (como a esquerda devia carinhosamente saber) assim como da própria aceitação da liberdade na distribuição das preferências, e em função de uma expressão numérica, em euros ou em dólares, ou em qualquer bem transacionável que passar a funcionar como unidade monetária. Quando se limita a distribuição dos factores de produção e dos recursos através de um processo qualitativo, acontece em geral, e como se confirma em todos os exemplos históricos conhecidos, uma forte limitação do número de participantes na decisão, e por conseguinte - citando José Guilherme Aguiar - também na democratização dos recursos. Aliás, a importância da expressão numérica é bem visível no mecanismo eleitoral da democracia que, apesar de tudo, se tem aguentado apenas porque se podem contar os votos. A introdução de critérios verbais - os famigerados valores - de justiça, equidade ou comunhão são muito mais difíceis de operacionalizar sem um instrumento de medida e geram, quase sempre, um sistema paralelo de autoridade assente sobre o mecanismo a que convencionámos chamar dinheiro.


Qualquer restrição da organização social - como a que é obscuramente proposta pelo Daniel Oliveira - implica um compromisso com a limitação destas funcionalidades do dinheiro e da sua relação com a representação da autoridade - que manifestamente tende a ser transferida para o sistema de preços nas sociedades modernas e é a principal causa do desconforto de pessoas como o Mário Nogueira. Ora, isto não significa nenhuma tragédia mas apenas a limitação relativa da liberdade, o que não devia fazer corar um socialista. Se as pessoas em vez de frequentarem programas de entretenimento na SIC fossem ler um bocadinho, chegariam à conclusão de que o falhanço rotundo de Marx foi não ter conseguido desenhar um sistema de autoridade alternativo, após um épico trabalho na demonstração da emergência do dinheiro como expressão das relações sociais.


Gisele Bündchen, a fim de que os leitores, eventualmente enfastiados com estas questões, possam descansar, por um momento, os instrumentos cognitivos.

Quando se começam a desenhar restrições políticas sobre a diabólica «economia», invariavelmente surgem palavras ou expressões como «mais democracia», «regulação», «distribuição da riqueza», sem que se perceba exactamente qual o pressuposto geral e coerente - e por isso manipulável pelo maior número de pessoas possível - capaz de fazer brotar esses maravilhosos conceitos no coração da república. Se estamos a falar da representação parlamentar deixem-me só ir ali ao canto rir um bocadinho. Se estamos a falar de outra coisa, palpita-me que temos de trabalhar mais e pensar melhor porque o que temos até agora é muito pobre. O maior erro da esquerda - e um erro que, por exemplo, Rosseau não cometeu - é subestimar o inimigo e não fazer a devida vénia à poderosa coerência interna de um sistema de autoridade sustentado, ainda que vagamente, na ideia de preço.

É preciso compreender que o capitalismo, sendo tremendamente injusto, é um sistema, e apenas será substituído por um outro sistema igualmente poderoso na sua coerência interna (como a esquerda, e a direita, já agora, carinhosamente deviam saber). Palpita-me que a força desse futuro sistema decorrerá, como sempre, do grau de legitimidade sobre os grupos que protagonizam os objectos fundamentais do desejo, e se as revoluções burguesas se legitimaram junto de banqueiros, industriais, negociantes, agricultores, um sistema mais poderoso do que o capitalismo terá que se legitimar junto destes e das classes vanguardistas. O problema está em saber quais são essas classes. Mas palpita-me que esses protagonistas não andam longe da blogosfera.

Partilho da concepção de que o país que ia em massa para a riviera Mexicana é um mau enredo de telefilme barato, mas o país que sofre a desorganização da finança, dos bancos e dos políticos corruptos é um outro telefilme quase tão mau como o prímeiro. Na verdade, não sabemos exactamente o que fazer, e muito menos alcançamos os impactos resultantes da satisfação dos nossos desejos, mas como todos queremos ir para o céu, desfazemo-nos em declarações sobre a salvação de todos e de cada um de nós, numa oratória incontrolável, à maneira dos povos pré-científicos. A crise apenas revelou o que para qualquer pessoa inteligente é uma realidade desde os primeiros contactos com o mundo dos vivos: que a direcção das coisas e o seu significado nos são completamente inacessíveis. 

Mas há uma boa notícia, pois estamos diante de mais oportunidade, não para empreender ou salvar Portugal - o excelentíssimo senhor primeiro-ministro Pedro Passos Coelho que se foda - mas para tentar de novo, e de uma vez para sempre com propósitos firmes e verdadeiros, a resposta à única pergunta a que vale a pena responder: quem sou eu?



Jean-Jacques Rosseau, a primeira pessoa a ter a coragem de ser uma pessoa.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

A psico-sociologia da problemática da problemática psico-social: tudo bem convosco?

A julgar pelo ritmo com que segue o debate psico-social neste blogue, estamos todos fodidos e sem dinheiro para divertimentos mais substanciais, e desde logo me assalta novamente o problema epistemológico da linguagem como veículo de comunicação, uma vez que se acabaram as minis no frigorífico. É preciso estar muito desesperado - como todos parecemos estar - para acreditar que chegamos a algum lado por intermédio do raciocínio não indexado a um projecto social eficientemente adaptado, por exemplo, um partido, ou uma editora de largo espectro, ou uma Igreja, e no entanto há qualquer coisa de perturbador no triunfo do relativismo cultural.

Não sei se já repararam mas não temos feito outra coisa senão cuspir nas virtudes da economia de mercado e da democracia constitucional. Longe de mim sugerir que essa não é uma actividade enobrecedora, mas preocupa-me que não consigamos colocar o problema em bases mais circunstacialmente históricas, tudo bem maradona?, uma vez que também sabemos que as problemáticas psico-sociais contemporâneas e as razões que fazem de José Luís Peixoto, João Ricado Pedro, valter filho da mãe, Rebelo Pinto, Júlia Pinheiro, enfim tutti quanti, são razões que se prendem com uma necessidade a preencher no coração do povo.

Sempre tive um particular carinho pelos jacobinos e o seu sonho de razão, mesmo que munido com a afiada precisão das lâminas (apesar das recomendações de calma da nossa comentadora Alma), mas a verdade é que as pessoas ganharam e isso devia encher-nos de alegria. No entanto, continuamos perturbados. Eu juro que quero acreditar num mundo em que os livros de Peixoto promovem a reflexão da Raquel - a nossa mais recente simpática comentadora - mas nesse mundo de pescadores e carpinteiros como autoridades da cultura há qualquer coisa que nos continuar a pertubar, a todos nós que somos filhos de pescadores, electricistas e carpinteiros. Para lá do clássico aforismo que não quer calar - não foi para isto que se fez o 25 de Abril - também não foi para isto que se fez a escola e o mercado da edição. Ou terá sido?

Toda a gente tem a liberdade de ser comentador, publicar um livro, dar entrevistas, ser um autor de referência. Porém, julgo que a nossa perturbação - a de todos aqueles que protestam contra a autoridade do real mas recusam igualmente o socialismo científico - nasce de um sentido de injustiça. Eu explico. Ainda ontem lia esse magnífico apontamento autobiográfico de Calvino, O Caminho de S. Giovanni, onde num primeiro texto se relatam as recordações de um passado traumático, narrado da perspectiva de um filho, a partir da relação com a sombra tutelar do pai, e após a grande pata da morte ter esmagado o único e frágil cone de luz que permitiria, a ambos, aceder a uma desmistificação final do problema. Estão a ver que este é justamente uma concretização por um grande escritor do tema apenas ligeiramente aflorado em Morreste-me, a obra fundadora da aventura Peixoteana. Ora, nada me move contra os leitores que se afundam privadamente na prosa incompleta e pouco esclarecida de Peixoto. Tenho pena que fiquem por aí, tal como tenho pena dos fundistas dos 10 000 metros que tropeçam na segunda volta e se estatelam na pista com aquele semblante entre a lebre esbaforida e o ladrão apanhado pela populaça em fúria. Porém, quando os meios de comunicação esmagam as alternativas de escolha e os programas escolares, os ministérios da educação, as gasolineiras, as mulheres bonitas, os cartazes histriónicos, as estações de rádio, os humoristas netos de industriais austríacos, começam todos a funcionar como um padrão automático e repetitivo, tenho sempre muitas dúvidas de que isso não represente efeitos perversos para a nossa liberdade e igualdade, para não falar da tão estimada possibilidade de escolha que parece estar na base de todo o mecanismo.

Quero dizer que a economia nos ensinou que o recurso escasso por excelência é o tempo, e se lemos Peixoto, não lemos Calvino. É verdade que a «mão invisível» devia guiar os nosso sentidos cegos de desejo, mas isso no que diz respeito a preferências do corpo. Quando falamos da lei da oferta e da procura de produtos ideológicos, será que nos podemos permitir o uso da força empresarial? Será que estamos a medir bem as consequências do abandono dos mecanismos de transmissão da cultura e do património dos nossos queridos antepassados a mecanismos de preço? Será que estamos conscientes de que não adiante financiar bibliotecas e sistemas de ensino clássico quando os mecanismos empresariais, em cujo seio se fundamenta o futuro, sabotam a cada momento esse legado com uma racionalidade baseada na ignorância da literatura? Deixar ao critério de um público não especializado a escolha dos candidatos às oportunidades de especialização na escrita não será um brincadeira que nos empobrece culturalmente? Será que a falta de sensibilidade a este problema, longe de ser uma manifestação de racionalidade democrática, não é apenas uma perda total do sentido do impacto das nossas decisões individuais na vida de todos?

 
No fundo, podemos dizer que a perturbação diante do espaço e prestígio adquirido por escritores incapazes de dialogar com a exigência e profundidade da galeria clássica, nasce de uma inquietação diante da manifestação da força bruta. O que quero dize desde o início deste post - e que a Raquel, nossa comentadora, confirma com a sua experiência, involuntária ou não - é que a ligação entre estes medíocres e a formação alargada das consciências, não só reduz a margem de manobra das pessoas, mais exigentes e cuidadosas, que em vez de se multiplicarem em livros e banalidades sobre o real, foram estudá-lo, pensá-lo, e tentar reflecti-lo antes de se pronunciarem sobre o que quer que fosse (o que significa que nós, as forças do bem, estamos a ser fodidos em termos de vantagem comparativa), como introduz um esmagamento da invididualidade que é exigente consigo própria (e que penso ser a única forma de salvar a relação entre a igualdade e a liberdade), e uma menorização total das potencialidades do diálogo do indivíduo com o passado histórico e o presente colectivo, transformando a cultura individual no simples eco das relações de mercado. Isto é, sempre me pareceu que um Peixoto, um valter filho da mãe ou mesmo um Gonçalo M. Tavares são o triunfo do escritor profissional pós-industrial e digital, isto é, o equivalente usa e deita-fora, repete, usa e deita-fora, repete, em total articulação com as formas de comunicação modernas.

Nisto, julgo que chegamos a um ponto irreconciliável entre nós, os que pensamos, e todos aqueles que compram e consomem peixotices e tavarices. Se isto é apenas uma manifestação de pedantice da nossa parte, ou um sincero grito de alerta sobre o caminho que estamos a tomar na reificação das nossas referências culturais, é o que pretendo saber de vossas excelências. O mundo não vai acabar, eu sei, mas convém que estejamos, nós os inteligentes e excluídos, conscientes do arranjinho que nos prepararam ou que nós, com a nossa teimosia, preparámos a nós próprios.

Neste sentido, apesar de ser um adepto do bucolismo estóico - tendo já preparada a minha taça de Casal Garcia com 605 Forte - não posso concordar com José Mário Bronco quando sublinha que a solução é ignorá-los. Para terminar, vou resistir à comparação com o nazismo - o que desde logo atesta a minha qualidade intelectual - e recorrer à sabedoria popular: «enquanto o pau vai e vem folgam as costas, mas se ignoras o pau abelhudo, mais tarde ou mais cedo, levas com ele pelo buraquinho ao fundo das costas».

Por falar em pós-modernismo

Quando a minha mão involuntariamente agarrou neste livro, o meu cérebro não estava à espera de uma narrativa a la José Dan Brown Rodrigues dos Santos. Mas pagar por um texto com a qualidade dos acetatos com que a autora enfastidia os seus alunos, é no mínimo aborrecido. Nem todos podem ser José Hermano Saraivas, é certo. Mas isso não desculpa os parágrafos incompletos, quando não estão fora de sítio, e as páginas inteiras a falar de Afonsos, Sanchos e Leões sem mencionar a nacionalidade ou cardinalidade.

O que no fundo faz pena. Que professoras doutoras não sejam capazes de adaptar o discurso para matarruanos como eu. Ou, o que é pior, não se darem ao trabalho exactamente pelo facto do público alvo ser uma massa informe de iletrados. Já no primeiro livro da série, o José Mattoso safou-se com uma referência da Wikipédia que eu aposto singelo contra dobrado, ter sido colocada por um aluno voluntarioso. Não é preciso, não é necessário e mete dó.

Os autocarros da Vimeca

 não foram feitos para certo tipo de livros.



quarta-feira, 18 de julho de 2012

Carta aberta a maradona num dia especialmente triste para o Benfica

Neste momento particularmente difícil para toda a nação, uma vez que a Igreja parece querer reentrar no circunstancialismo histórico que nos determina, não posso estar de acordo contigo, maradona, e acredita que isso me entristece, por razões que não posso agora explicitar.

Na verdade, incorres num erro típico de quem não fez estudos aprofundados de economia, e nisso estás acompanhado por Vítor Gaspar e Passos Coelho, isto é, insistes na ideia de que o circunstancialismo histórico concorre para a explicação da merda que somos. Com efeito, a menos que te tenhas tornado um corioláceo (mistura de crustáceo com Coriolano) defensor do marxismo, a economia neo-clássica de Becker e Friedman mostrou gloriosamente que as sociedades são livres para se foderem à vontade e não necessitam de ajuda da história ou de um mediocre como António José Seguro.

Ressalvas, e bem, que apenas a invenção de um sistema de previsibilidade nos poderá garantir um futuro digno de um panfleto das testemunhas de Jeová (mas apenas com as americanas loiras e boazonas e sem os leões) mas eu pergunto, porque gosto de perguntar coisas: e se a inconclusão das políticas de Passos Dias a Foder Portugal Coelho for precisamente o garante de uma situação de caos que precipite os incentivos necessários para que génios como tu passem a gastar o seu tempo com uma exacta reflexão sobre a forma de representar a previsibilidade, eliminando de uma penada os partidos, em vez de andarem a coçar os tomates na blogosfera porque se realizam profissionalmente numa outra merda qualquer que a estabilidade do sistema ineficientemente, do ponto de vista do bem comum - peço desculpa -, vai garantindo?

É bom de ver que estamos em pleno território da teoria da agência e um dos sinais de que uma teoria é boa - e deus abençoe a boa e rara teoria económica - é a sua capacidade de sendo um instrumento estar completamente esvaziada de todo o valor político, necessariamente subjectivo, personalista.
Ora, a assunção do interesse de Portugal nas tuas linhas é um desgosto que não posso deixar passar em claro, e o facto de achares que a mudança do mundo, que necessariamente não depende de nenhum circunstancialismo histórico mas apenas das leis da física, possa ficar entregue aos burros e ignorantes do 5 Dias, é um dado que me enche de melanconia, como dizem os italianos.

Na verdade, o que é fascinante na teoria económica, a verdadeira, única e anjelical, e que ninguém lê, pois está encerrada em livros dos anos 30 que não falam nem de Keynes nem de ajustamentos, é a clara separação entre as consequências dos nossos actos - por exemplo, retribuir ao mundo empresarial Passos Coelho - e o juízo político e moral sobre essas consequências. Ou isso ou alguém vai ter que explicar qual foi o circunstancialismo que explica que a Alemanha tenha produzido Bismarck, Hitler, Brant e Merkel quase no espaço de um século. Ok, não foi um bom exemplo.

Mas, em todo o caso, pelo menos, a fazer fé nesse circunstancialismo histórico, teriamos que explicar em que medida é que Salazar não foi capaz de fazer mal a Portugal para lá do seu circunstancialismo (geográfico, astrológico?) e em que medida é que o circunstancialismo de D. João II e D. Manuel lhes permitiu inspirarem uma música a Carlos Paião que conclui gloriosamente que num passado longínquo quase chegámos a ser alguém?

Como estou ligeiramente embriagado termino com uma recomendação. Não terá chegado o tempo de os indivíduos se deixaram de colectivismos e deixarem que o circunstancialismo histórico, na medida em que não determina o que quer que seja, permita que as coisas possam ser o que na realidade são, sem que estejamos sempre a tentar que as coisas sejam os que nós pensamos que são? Para isso só vejo um caminho: fazermos silêncio.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

Uma pechincha alf, comprei os 2 por menos de 13€

e a adorar ler o primeiro, embora com as dificuldades inerentes à leitura do texto original, não sendo eu propriamente um marinheiro. Lá chegarei ao Joyce.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Verão Irlandês

Já que estou numa ilha no atlântico norte, desejo-vos um bom fim de semana e vejam isto:



não tenham pressa, take your time.

quarta-feira, 11 de julho de 2012

À consideração de mim próprio e de todas as pessoas que andaram enganadas durante vários anos acerca da natureza da literatura

"Poetic" statistical machine translation



Recomenda-se desde já a todas as Professoras do Ensino Secundário que mantenham a calma e telefonem urgentemente ao Dr. Mário Nogueira.

Só depois de publicado este post reparei que ao identificar o sujeito da minha ironia o fiz através do género feminino: porque não «Professores do Ensino Secundário»? É verdade que apenas por uma vez fui industriado na língua de Camões e Pessoa por um indivíduo do sexo masculino, e só durante uns poucos meses, sendo o referido indívíduo um desiquilibrado cuja única lição consistiu numa variação temática sobre a não correspondência entre laços genéticos e contratos matrimoniais, aspecto que na sua óptica justificava uma relação mais estreita com os filhos. Em todo o caso, e embora Lucien Febvre fale da importância materna na transmissão da religião, a coerção linguística parece assumir contornos traumáticos no caso das repressões serem efectuadas por indivíduos do sexo feminino. Meu Deus, teremos aqui um problema?

À consideração dos Governos democráticos de todo o mundo, com especial referência ao Partido Comunista Português

Adam Sadilek :: Publications

terça-feira, 10 de julho de 2012

Quem é, na verdade, Miguel Relvas? Será o Romeiro?



Todos conhecem a minha profunda estima pela instituição escolar e não posso, por isso mesmo, deixar de expressar a minha estupefacção perante a tempestade que se abateu sobre Miguel Relvas. Apesar da minha falta de disponibilidade para esclarecer as mentes mais ignorantes deste país, devo dizer que ainda não aprendi a manter a calma sempre que a propósito de uma qualquer outra coisa, os portugueses decidem começar a tentar pensar sobre o conhecimento e as suas instituições. Devo dizer que os portugueses, apesar de tudo, revelam muito mais sagacidade na apreciação da sardinha assada e das taxas de produtividade da terra, em cultura várias, do tomate à beterraba acuçareira, ou não fossemos nós um povo de camponeses como o caro leitor pode comprovar agora mesmo, se o desejar, consultando o album fotográfico de casamento dos seus pais e atentando no traje e tom de pele dos respectivos avós. Uns cavadores em 80% do casos. Pois é, como diria João Gilberto.

Ainda no Domingo, numa feira do livro de Verão estabelecida em tenda de lona numa falésia portuguesa, o mais famoso e recente sucesso literário, produzido pela empresa Leya, apodrecia numa mesa vazia à espera que as sucessivas ondas dos mais de 20 000 livros vendidos, fizessem chegar até ele uma qualquer adolescente sofredora, um funcionário público deprimido, ou uma professora divorciada, com um exemplar na mão, a fim de serem taumaturgicamente sagrados com as palavras divinas do autor: para fulano tal, com estima. Haverá alguma relação entre João Pedro Ricardo e Miguel Relvas para além da manifesta ignorância sobre a literatura e a vida? É esta a questão que proponho para o seminário de almoço de hoje, enquanto trinco uma chamuça oleada e sinto o caril vibrar no esófago as suas asas pontiagudas.

Na verdade, é com grande ternuna que vejo a comunidade descobrir a importância da certificação e da burocracia - uma coisa que custa dinheiro e a que logicamente a Universidade Lusófona não se presta - em mecanismos de transmissão do conhecimento e representação política. Relvas é uma pessoa que utilizou os seus recursos para comprar um produto, neste caso um título académico. Qual é o problema? Todos os dias, o conjunto definido pelas Universidades Privadas, e cada vez mais também pelas públicas, vende títulos académicos, com ou sem frequência de cadeiras, às vezes com processos de investigação e defesa de teses marketingamente incluídos. O que está em causa são os aspectos insondáveis da justiça: afinal, sempre há um problema político na igualdade, isto é, os pseudo-alunos que foram obrigados a prestar prova das suas capacidades sentem-se injustiçados na sua taxa de esforço, o que apenas demonstra a monumental ignorância dos alunos da Lusófona, e da sociedade portuguesa, em matéria de conhecimento e ciência. As pessoas continuam convencidas de que o saber se pode certificar institucionalmente, e por isso laboram num erro tão antigo como grosseiro: confundir mecanismos de segurança e previsão - a certificação de currículos e competências - com a posse do conhecimento real sobre as coisas. O que está em causa nas Universidades, desde há muito, para não dizer desde sempre, é a autorização política para exercer uma profissão, não a posse de conhecimentos. Às vezes, e por sorte, dá-se uma intersecção dos dois aspectos. Neste caso, os alunos da Lusófona, ou de outras universidades concorrentes, poderão manifestar dúvidas quanto às condições de legitimidade de Relvas para exercer cargos políticos e relações internacionais. Há na licenciatura de Relvas um problema? Claro que não, direi até mesmo que num mundo ideal, Relvas seria um catedrático de ciência política, pois sabe três vezes mais que Nuno Rogeiro ou Nogueira Pinto, quer sobre o o exercício de cargos políticos, quer sobre a política em geral. Ou afinal, a realidade não é uma boa certificadora da justiça? Meus caros, se assim é, se Relvas, sendo um ignorante sobre ciência política, consegue ser eleito e pertencer a sucessivos governos, lamento ter que informar a humanidade sobre um pequeno facto: Relvas é apenas um pequeno vigarista na mega-fraude em que todos laboramos. Se calhar, Tony Carreira não sabe cantar, Cavaco Silva não sabe economia, José Alberto Carvalho é apenas uma pessoa com o liceu que mal sabe articular dois conceitos e dirige pessimamente as entrevistas aos candidatos ao poder, José Luís Peixoto e João Pedro Ricardo são oportunistas ignorantes que exploram a analfabetismo literário e a falta de tempo dos consumidores de livros, Marcelo Rebelo de Sousa, um animador de festa que por ser filho de um político salazarista se transformou num intelectual de nomeada, etc, etc, etc.

Como não podemos ir por aí, sob pena de nos esfumarmos todos num buraco de energia negra, temos que seguir outro argumento. O que Relvas desconhece é a literatura especializada sobre a política. Mas haverá algum ser vivo capaz de demonstrar que o conhecmento do livro A ou do artigo B é condição essencial para produzir um discurso verdadeiro sobre os factos políticos e a sua respectiva análise? Claro que não. Custa ter que dizer isto num blogue obscuro, mas o tiro no pé dos mecanismos de certificação elitista do conhecimento não foi dado por Relvas, foi dado por todos nós, em geral, quando contratualizámos uma coisa chamada democracia - o acesso do povo à capacidade para governar a nau do estado (cibernética) - e a tentámos basear não no trabalho escravo mas na distribuição e divisão do trabalho a partir do lucro livre implícito num sistema de preços, bem como pela ciência política, em particular, oferecendo à comunidade uma pseudo-ciência que não passa de um série de exercícios circenses sobre uma matéria sobre a qual mantemos o mesmo nível de ignorância de há pelo menos 2500 anos, como os sucessos do século XX (do nazismo à crise das dívidas públicas) amplamente demonstram. Que possam existir professores de ciência política remunerados é que deveria merecer a nossa mais profunda e estridente gargalhada.

Mesmo dando de barato que o processo universitário e a certificação disciplinar é o melhor caminho para os propósitos de segurança e informação necessários a uma economia de mercado, deve dizer-se no entanto que há uma enorme confusão entre o papel da escola como mecanismo de transmissão de conhecimento entre gerações e o seu papel como instituição política na certificação dos saberes. Estou aliás convencido de que é precisamente desta confusão (entre legitimidade política e eficiência da transmissão nos mecanismos de auto-conhecimento, reconhecimento e adaptação ao ambiente) que resultam a grande maioria dos problemas da nossa época. É que embora a escola e as universidades mantenham o monopólio na certificação do saber, há muito que perderam o controlo sobre a memória e a transmissão - sobretudo depois da generalização da comunicação de massas, das bibliotecas públicas e da internet. Ninguém reparou mas vivemos mergulhados num mundo de tecnologia informática mas equipados com instituições de política científica que datam na melhor das hipóteses do século XVI. Neste sentido, desejo coragem e perseverança a todos os que como Miguel Relvas ou Aníbal Cavaco Silva sofrem, sofreram ou sofrerão a ira imprevisível dos deuses que é o preço a pagar por terem decidido navegar na tremenda confusão entre legitimidade política, ignorância e sucesso professional.

domingo, 8 de julho de 2012

E termómetros

Também dava jeito que o pediátrico tivesse termómetros. Ficam
as sugestões a quem de direito.

modernices

A minha filha fez hoje 8 meses, e para celebrar levou os país para a noite em
Coimbra. O hospital pediátrico é moderno, bonito e tem WiFi
grátis. Bom bom, era se tivesse mais médicos e enfermeiros
de serviço.

O tribunal constitucional, pelo que fui apanhando nas notícias,
revelou bom senso a resolver um imbróglio criado pelo governo.
Críticas à parte, não me parece razoável esperar que o tribunal
limpe as cagadas do governo. Nem que seja responsável pelas
soluções que o governo venha a encontrar para desencantar
o graveto para pagar à troika.