sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Utilizarão as máquinas a blogoesfera?

A resposta é sim, mas não é isso que me traz aqui. Ando há dias a preparar um post sobre outro assunto, mas o alf obriga-me a fazer um desvio. E já que a Trapistes Rochefort nº 10 já está aberta,  siga o baile.

Ainda andavam os tipos da Kara a esgalhar o pessegueiro a meia dúzia de bytes num ecrã, e já esta actroid vendia shampôs no Japão. Diz quem a viu in loco, que a dois metros de distância não se percebia a diferença para uma pessoa de carne e osso.


O curioso na actroid não é ser practicamente impossível de distinguir de uma japonesa de carne e osso, mas sim existir algo na actroid que imediatamente nos alerta para o logro. Os japoneses, que andam nisto há já várias décadas, descobriram o vale da estranheza (Uncanny Valey para quem quiser procurar no Google). O Robert Zemeckis descobriu à americana, isto é, fez um filme de animação o mais realista possível e fodeu-se à grande porque as personagens eram estranhamente parecidas com pessoas.

A Rochefort vai a meio.

O irmão da actroid e o bicho abaixo retratado, são actores secundários no documentário sobre esse gigante da computação que foi o Joseph Weisenbaum. Estranhamente para um filme feito em país protestante, demonstraram um clamoroso desconhecimento da Bíblia. O documentário, de que possuo cópia legal em DVD, é uma aliteração da Torre de Babel mas os tipos só  tocaram na religião para queimar a Igreja Católica. Pedro Arrojamente típico.


A Rocherfort está perigosamente a 1/3.

O que em mim despoletou esta vontade de escrever, foi a referência ao Hilbert. Que só peca por defeito. O Hilbert foi a semente que germinou no Turing e no Gödel. Os três são por si só, material para muitas boas estórias contadas à lareira. Fico-me por uma (ando a ler crónicas do Onésimo, nota-se muito, eu sei). Por ocasião de uma treta qualquer, decidiram homenagear o já velhinho Hilbert com uma colectânea dos seus teoremas matemáticos. A moça encarregue de o fazer descobriu, com um germânico horror, que as provas do Hilbert estavam todas, todas sim, manchadas de erros. Mas, e aqui se vê a genialidade do homem, após alguma labuta, a moça apercebeu-se de que os teoremas eram válidos, apenas as demonstrações estavam erradas. E aqui vem a punch line: parece que o Hilbert era capaz de sentir de que forma os conceitos matemáticos encaixam mas não era capaz de os explicar. Ou em linguagem que os Luíses Peixotos entenderão, o Hilbert até percebia bué de gramática mas não sabia alinhavar duas frases seguidas. Um bocado como este que vos escreve. Fiquem por isso sabendo que é verdade o que já o Álvaro de Campos dizia:

O binómio de Newton é tão belo como a Vénus de Milo.
O que há é pouca gente para dar por isso.

A Rochefort está quase no fim.

Tanta merda para chegar aqui. Afinal o que é vida? O Philip K. Dick sugeriu que seria algo como a empatia, mas o Robert Rosen no out-of-print-mas-há-uma-cópia-na-blioteca-de-civil-do-técnico Antecipatory Systems contrapôs algo mais palpável. Um objecto vivo é um sistema aberto, por oposição aos sistemas fechados que são por exemplo os computadores. Por isso é que o seres vivos sofrem de senescência, mientras que os não vivos não. No Life In Itself adicionou mais um grão: os sistemas vivos são os que existem devido a si próprios enquanto que os não vivos (ele fala explicitamente em máquinas e mecanismos) são os que existem devido a necessidades exteriores a si próprios. Dito de outra forma, em última análise, eu faço o que faço para que eu continue vivo enquanto que o computador faz o que faz porque outro algo (um computador ou uma pessoa) assim o requer e necessita.

A Rochefort acabou, a partir de aqui prossigo com os motores desligados, em vôo planado.

Ao fim de contas volto ao ponto de partida do alf, e sim, uma máquina é algo que existe para a nossa própria conveniência, fruto da nossa inépcia e preguiça. No entanto, nos dias de hoje convêm ter bem claro que a maioria das máquinas existe para a conveniência de outras máquinas, e assim sucessivamente em cadeia até às máquinas cuja razão de existir somos nós. A causalidade está lá, mas a cadeia aumenta a olhos vistos todos os dias. Bem a propósito, ainda hoje discutia com um colega de trabalho uma forma de acrescentar mais uns elos à cadeia.

No entanto, há da parte das ciências moles, por oposição às ciências duras, alguma confusão em relação ao que exactamente são exactamente os computadores. O Daniel Dennet é disso exemplo na bela trampa que é o Consciousness Explained. Não só não explica coisa nenhuma, como confunde explicar o como com explicar o porquê (ou seja descrever vs justificar). O que é de estranhar para um tipo que se diz filósofo e portanto, deveria ter muito mais cuidado com as palavras.

Voltando ao gigante que foi o Weisenbaum, a tragédia da sua vida foi exactamente a dificuldade em fazer entender as gentes que a ELIZA era nada mais nada menos que uma tanga, ao nível das licenciatura universitárias, do Relvas em particular. Assunto aliás já exaustivamente analisado nesta casa. O mesmo se passa com os computadores.  Dê por onde der, e não há muito espaço para isso por mais Gigabytes que se lhe acrescentem, não serão as máquinas que nos farão confrontar com os nosso medos mais ancestrais. Mas era interessante que o fizessem.

3 comentários:

Anónimo disse...

namedriping excessivo.hoje apetessia-me ler algo menos referenssial.

o anão gigante disse...

*estranheza

alma disse...

Não sei não :) por aqui fico fascinada ou mesmo maravilhada com certos programas ao serviço do mero utilizador :)
e isso faz-me pensar (não muito mas o suficiente)

interessante desenvolvimento ao post do alf :)