quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Só à sueca é que não se podem fazer renúncias

Existe uma personagem heróica que emerge invariavelmente no imaginário popular: o eleitor que vota em branco. Se em Abril a canção era uma arma, parece que agora é o papel por preencher, cuidadosamente dobrado em quatro, delicadamente enfiado na urna. Como qualquer romancista medíocre bem sabe, todo o herói precisa de um vilão. Emerge o vilão eleitoral, efeito dramático assim obriga, o tipo que se abstêm. Eu, por exemplo.

O votante em branco é tipo impecável, toma banho e corta as unhas, enquanto que os abstinentes cheiram mal dos sovacos e fazem peregrinações ao cemitério de Santa Comba Dão. O voto em branco é um protesto válido e corajoso, não votar uma cobardia ignóbil. Pena que os factos contam uma hist+oria diferente. Primeiro que tudo, o voto em branco não conta assim o diz a CNE. É eleito quem tiver mais de metado dos votos expressos, sejam 10 ou 10 mil.

Segundo, aceitemos a ideia de que a populaça está a passar uma mensagem com um significativo voto em branco. Qual é exactamente essa mensagem ? Não se sabe porque o papelinho está por preencher. Quem votou em branco é monárquico ? Facista ? A caneta não escrevia e teve vergonha de pedir outra ? Não se sabe, ponto final parágrafo

Se a mensagem é de protesto, não sabemos mas vá lá eu deixo essa porta aberta, é de protesto contra o quê e contra quem ? Suponhamos que o Fernando Nobre (o único a quem eu convidaria para jantar, fazia-lhe um ceviche corvina que o homem se regalava todo) ganha as eleições e 90% dos votos foram em branco. O que é que deve o presidente eleito fazer ? Convocar novas eleições ? Demitir-se ? Ignorar e seguir em frente como se nada fosse ? O distinto leitor faria o quê ?

Está claro que todos os valentes que se levantam no domingo de manhã para serem os primeiros a votar em branco e/ou desenhar o Cavaco a ser sodomizado, sabem porque é que estão a "protestar". Mas os candidatos não sabem e não têm forma de saber. Por isso mesmo eu conto (se a esposa assim o permitir) passar a manhã eleitoral com o Sanjuro ou o Kagemusha. Para quê perder o meu tempo a fazer passar uma mensagem que não vai, nem pode, ser entendida pelos destinatários.

Posso eventualmente ser uma carraça democrática, sorvendo os benefícios da vida no Portugal de Abril mas sem contribuir com peva para um Portugal melhor. Está bem, mas só á sueca é que não se podem fazer renúncias, e não é por isso que elas deixam de ser feitas. É, digamos assim, parte das regras do jogo.

1 comentário:

Anónimo disse...

Ora nem mais. Ainda se o voto em branco fosse um voto expresso... não sendo, eu também vou dar uma volta de bicicleta