quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Agora posso morrer em paz porque os meus olhos viram uma vigília pela verdade desportiva

Os sentimentos de revolta resultam sempre em raríssimos momentos de belo efeito, sobretudo quando são animados por Presidentes de Associações Comerciais que falam alemão - sobrepondo o domínio babélico sobre uma larguíssima cultura - e abrilhantados por empresários que actuam nos ramos de aluguer de Pavilhões de Desportivos e controlo de murros em casas de diversão nocturna. Não me lembro de uma coisa tão bonita desde que no funeral de Amália Rodrigues algumas senhoras, com mais de 90 quilos e cerca de 1,35 de diâmetro, resolveram improvisar versões atabacadas de «São os caracóis, são caracolitos», inaugurando uma alusão ético-crítica sobre o real, valorosamente resgatada por Dias Ferreira (quer vossa senhoria que traga o cavalo ou as pistolas de prata?) para caracterizar um conhecido comentador televisivo que, alegadamente, teria feito alusões a um suposto processo de tratamento psicológico a que o próprio Doutor Dias Ferreira, num momento de infortúnio, teria sido, alegadamente, submetido (e quem entre nós não bateu já com os costados no psiquiatra que atire a primeira caixa de Xanax). Isto retira-me esclarecimento para comentar um post relativamente bem conseguido de António Figueira, mas esgalhado a partir de um conhecimento pseudo-profundo do antigo liberalismo no reino da Dinamarca, e ressuscitando a questão bizantina acerca do verdadeiro (se fazem o obséquio, aqui, todos devem limpar a boca) espírito do liberalismo mais radical, dormitando o problema, na opinião de Figueira, em saber se o dito liberalismo radical é um esforço de conservação ou uma aposta na reforma do entendimento e condição humanos. Tenho a dizer que, apesar da honestidade do post, um dos problemas recorrentes em indivíduos que leram as obras completas de Poulantzas e Althusser, é a incapacidade de entenderem que os discursos assentam em base fisiológica semelhante à que o falcão utiliza para se precipitar sobre a presa ou o peixe de coral para morder até à morte o peixinho cinzento que lhe invade o território. É sempre impressionante assistir às frases elaboradíssimas do canto do rouxinol (com múltiplas alusões a Stuart Mill, à claríssima, como água do luso, definição do que é clássico, ao conformismo, ao transformismo, torys, whigs, a baixa do Dafundo, tudo coisas que fazem barulho de certa maneira). O que irrita em maradona, e faz a sua fama, é, neste capítulo particular, o carregar do estilo, fingindo que pensa, e pensar fingindo que trabalha o estilo. Raciocínio em forma de sentimento, para usar uma definição conhecida, sendo o seu barulho de tal forma ensurdecedor que não deixa espaço para outros galináceos. A eficácia da imutabilidade dos conceitos é uma coisa que padece de demonstração e a alusão ao conceito de arqueologia foucaultiana, não deixa de inspirar o vómito e demonstrar que António Figueira também usa as palavras a partir do seu valor de uso, ou não teria a coragem de colar, a propósito de qualquer tipo de liberalismo, palavra e coisa. De facto, com bom jogo de cabeça ou notabilidade nos pés, o que importa é se a bola entra.

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