sábado, 16 de agosto de 2008

Raciocínio em forma de sentimento

Ontem lia um novíssimo poeta português. Dos que colecionam metáforas em caderneta do méxico 86. Havia uma dupla de iraquianos estranhamente parecida com os homens que na aldeia da minha avó passavam todas as madrugadas a caminho da mina. De lambreta e capacete italiano. Fazia frio, mesmo no verão. Ás vezes havia um acidente. Não sei se da geada, se das minis tomadas me jejum na tasca da Barroca.
O problema das metáforas é serem como a geada do outono. Cortam. São esguias e, por vezes, a roda foje. Pimba. Focinho no alcatrão da serra. E se a geada não corta, não há metáfora que salve a voz do literato. São bafuradas de colarinho branco. Ou de barba sebenta, o que vai dar ao mesmo. Restos de literatice. Sem que a morte se ponha de permeio.
Com efeito, o poeta tem que beber a bica preta, já aqui o confirmámos. Mas de cabeça levantada e sem mariquices de pegas no paleio. O poema é simples. É um centro-remate. Uma punhalada. Um grito de milhafre. Uma aceno já no fim da estrada.
Porquê o cinema paraíso?
Porque talvez nos ensine a mais brutal sequência de condensações humanas. Pois é meu caro Fernando Pessoa. Não vamos lá com descrições interiores. Quem quer saber, ó novíssimos poetas, das vossas crises sentimentais de citadinos desorientados. Pensem. Pensem pelo menos um minuto. Forrem os vossos sentimentos de Kant, deitem ao lixo as vossas rançosas colecções de rimas em celofane-literário e talvez saia qualquer coisa que aproveite ao elogio do ritmo e do conhecimento (é disso que se trata, um raciocínio em forma de sentimento).

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