domingo, 9 de dezembro de 2007

Linda, Linda esta balada que te dou

O estimado leitor decerto estranhará o perfil deste dueto: Armando Gama em pano de fundo, uma espécie de baixo contínuo, enquanto o Professor João Carlos Espada entoa virtuosos solos de liberalismo bolorento. Na verdade, estimado leitor, eles combinam a erudição e a sabedoria das coisas simples. Prepare-se confortavelmente, ponha o video em movimento. Depois agarre-se bem para não ser arrebatado em êxtase místico.

"A PROPÓSITO DE FÁTIMA"
pelo Professor João Carlos Espada in Expresso

Em Fátima, no fim-de-semana passado, terão estado cerca de meio milhão de pessoas. Numa intervenção radiofónica, José Miguel Júdice comentou o fenómeno com a sua habitual perspicácia. Observou a intensa manifestação de fé, que contraria os cíclicos prognósticos sobre o declínio da religião. E chamou a atenção para que essa manifestação, ao contrário de outras noutros países, foi profundamente pacífica, inclusiva e não política. Acrescentou que a igreja católica tem em Portugal uma vastíssima acção social de apoio aos desfavorecidos que devia ser mais acarinhada pelos poderes públicos.Seria desejável que estas palavras sensatas pudessem contribuir para atenuar o preconceito anticatólico, ainda tão forte entre nós.Um elemento importante deste preconceito continua a residir no argumento de que o catolicismo se opõe à democracia. Mas os factos também não corroboram essa tese. Os estudiosos da transição à democracia reconhecem hoje que o 25 de Abril português esteve na origem da chamada “terceira vaga de democratização mundial” — uma tese inicialmente proposta por Samuel Huntington.Entre 1974 e 1989, observou Huntington, mais de trinta países, na Europa, Ásia e América Latina, transitaram de regimes mais ou menos autoritários para regimes mais ou menos democráticos. Dois dos três primeiros países a democratizarem-se (Portugal e Espanha) são maioritariamente católicos. A seguir, o movimento de democratização atingiu seis países da América do Sul e três da América Central, todos eles dominantemente católicos. As Filipinas foram o primeiro país asiático a reunir-se à ‘terceira vaga’. E a Polónia e a Hungria católicas foram os primeiros países do Leste europeu a ensaiar a democratização. Como observou Samuel Huntington, “três quartos dos países que transitaram à democracia entre 1974 e 1989 eram dominantemente católicos”.Mas seria ainda um equívoco reconhecer apenas esses contributos mais recentes da religião cristã para a liberdade. Muito antes de Voltaire ter escrito sobre a tolerância, John Milton e John Locke fundaram o dever da tolerância na moral cristã. Lord Acton, o célebre católico liberal inglês do século XIX, argumentou persuasivamente que S. Tomás de Aquino lançara os fundamentos da atitude liberal. E o católico Alexis de Tocqueville observou, em páginas veementes, que a democracia na América não podia ser compreendida sem o contributo da fé cristã para alicerçar o ideal das limitações constitucionais ao poder político e do direito natural dos indivíduos “à vida, liberdade e busca da felicidade”.

Caro leitor, busquemos a felicidade e a limitação do poder político nesta feroz ditadura que é Portugal, conduzidos pela mão do Professor Espada. Quando em Portugal governava esse grande democrata, António Salazar, não me lembro de ter lido ou ouvido que o santuário de Fátima desempenhasse especial papel na limitação do poder político. Parece que houve até um bispo corrido à pedrada em Nampula (com valentes puxões de orelhas do magistério) por manifestar opiniões contra a guerra - essa forma eloquente de ser liberal de G3 na mão. Mas isso é a minha falta de perspicácia. Desgraçadamente ela foi toda concedida ao Doutor José Miguel Júdice. Eis que agora o Professor Espada canta triunfante a influência dos católicos na revolução e no processo democrático. Afinal o papa vinha em cima da chaimite, secundado pelos anjos e ninguém foi capaz de o saudar. Conta-se até que Otelo pediu em primeiro lugar o "a 13 de Maio" mas o MFA achou que era um exercício de humildade mortificador conceder antes o privilégio de canção da revolução ao fascista José Afonso (qual bofetada de luva branca dos democratas devotos marianos a esses comunistas defensores da ditadura do proletariado. Pelo que a virgem não pôde encabeçar a revolução, nem o "13 de Maio" ser entoado pelas gargantas dos soldados. Não faz mal! Viva o 13 de Maio e viva o pensamento liberal.
Professor Espada...linda, linda esta balada que nos dás/ Linda, linda esta balada que nos dás.


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