domingo, 31 de maio de 2009

Em directo do Porto com o nosso enviado especial

Quis nosso Senhor que estivesse no Porto cidade, no dia em que o Porto clube ganha a taça. No mesmo local onde decorre uma feira do livro, algumas centenas de pessoas prestam vassalagem ao dragão instalado numa carrinha de caixa aberta, que cospe fogo pelas ventas. O policia ao meu lado ri-se ao deparar-se com isto:



Um turista pergunta-me o que se passa. Não compreende o porque de tanto barulho. Explico-lhe que o Porto ganhou. E isso para este pessoal é tudo. Pinto da Costa olé.

E ao sétimo dia, cansados, os liberais decobriram a planificação da economia

Numa das inúmeras situações hilariantes de A Capital – não o jornal mítico dos anos 80 mas o romance inacabado de Eça – o protagonista esbarra invariavelmente contra a estupidez dos jornalistas. Nas redacções atafulhadas de carreiristas vindos da província, treinados nas recepções dos salões e habituados aos almoços políticos da Casa Havaneza, os jornais, ainda confundidas com o barulho e o cheiro das tipografias, descreviam o high-life, os brindes, as cominações, as estratégias, os perfis, sem que dos crâneos fumegantes dos directores saísse uma única ideia. Hoje, passados mais de cem anos, o que temos? Temos mais um belíssimo editorial do senhor director do Expresso que vem explicar-nos o coração problemático da actual crise, entre recordações dos nossos avós e a memória das lavadeiras honradas e trabalhadoras, esfregando a roupa nas pedras do rio, sonhando, quando a luz do sol trespassava as copas dos plátanos ou lhes vinha à mão algum pano de linho bordado a ouro, com a vida doce e confortável dos senhores morgados. Isto era no tempo em que cantava o rouxinol e a andorinha fazia o seu ninho nas casas honestas dos lavradores. Hoje, no meio da treva moral e da perdição hedonista do consumo, o senhor Director, após o derrube definitivo das ideias feitas dos políticos, dos religiosos e dos economistas, lança da sua cabeça, como trombeta no silêncio espesso de uma manhã de batalha, o estrondo destas novidades: «Os nossos avós amealhavam. Juntavam dinheiro para uma casa ou para as obras de uma casa. Uma festa, uma refeição fora, uma viagem faziam-se quando havia dinheiro, excepcionalmente. Nesse aspecto, era uma sociedade ainda adequada aos parâmetros da ruralidade: plantar para mais tarde colher.» Ó que saudades dos nossos avôs. Eles, com efeito, trabalhavam, remediados com o caldo que a labuta diária ia permitindo, migando duas couves e uma broa para uma panela enquanto se chegavam ao canto do lume, sustendo nas mãos o velho caderninho da contabilidade. Mas depois da 2ª Guerra Mundial, com o fumo dos morteiros e as serpentinas nas mãos dos vencendores, enquanto se agitavam nos céus do mundo e nas avenidas cosmopolitas de Londres e Nova Iorque, as bandeiras listadas, azul-vermelho, da Inglaterra e dos EUA, os nossos avós foram levados pela enxurrada da vida fácil. «A partir dos anos 50/60 do século passado, sensivelmente, tudo começou a modificar-se no mundo. O sistema 'viaje agora e pague depois' foi um dos sinais; como o fim do padrão ouro na moeda ou a palavra já no final dos refrães políticos. As mesmas ideias disseminaram-se - prazer, crédito, casa, automóvel, viagens, tudo era imediato.» E porquê? O senhor director do Expresso salta, comodamente, a explicação. Mas porque não dorme, e há um cheque a levantar no fim de cada mês, arrepende-se e faz a devida contrição: «Atenção: não digo que isto tenha sido errado ou condenável, apenas tento descrever uma realidade em poucas linhas.» Isto não é condenável, com efeito. Quem compraria o Expresso, e o seu cinema-brinde, se não se tivessem multiplicado, como malmequeres no prado, os leitores de dvd? Na verdade, o senhor Director perde-se aqui no nevoeiro da explicação científica: por um lado, sente-se ressabiado por um sistema económico, altamente complexo – o capitalismo -, que não compreende; por outro, estranha as dificuldades que o crescimento da riqueza, tão aplaudido há duas semanas, vai causando na mesma medida em que se democratiza o seu acesso. Suado, extenuado, abatido, mordendo nos dentes a esferográfica, o senhor Director chega finalmente ao seu destino: «Embora isto não absolva (é óbvio!) os crimes cometidos por alguns poucos, todos nós - esquerda e direita, pensadores, economistas, gestores, opinadores ou políticos - contribuímos um pouco para a situação. Não o reconhecer é não compreender a crise.» O leitor recosta-se na sua cadeira e sossega, resgatado do inferno mental que já aquecia, em lume brando, todos os que ilicitamene enriqueceram sentados, em cadeirão de veludo, sobre os contratos de endividamento. Sossega porque foram encontrados os culpados da crise. Haverá julgamento e justiça, com trovões bíblicos e sentenças ameaçadoras. De quem é a culpa? Depois de recolher nas suas mãos a coruja de Minerva, sagrado com o ouro resplandecente da sabedoria, o senhor director lança com estrondo esta verdade: a culpa é toda nossa.

Garantia de Presidente

Prosa retirada do site da RTP, sendo a afirmação de Pinto da Costa.
"Não sei se demorará muitos anos para que os clubes de Lisboa não queiram a final da Taça em Oeiras. Se calhar, dentro de alguns anos vão defender que deve ser em Marrocos. Mas nós não aceitaremos", garantiu.




Garantiu? Será que o jornalista não percebeu que a afirmação, de um tremendo mau gosto, era irónica?

Provavelmente é o mesmo que há alguns dias dizia que a final seria no Estádio de Oeiras.

Mas não deve ser o mesmo que, em plena peça jornalística, transmitida no Telejornal, retratou o dia da campanha eleitoral de Miguel Portas. Segundo o jornalista, o candidato andou pelas ruas de uma cidade da margem Sul, entrou em todas as lojas... "mas não comprou nada".




Graças à RTP, ficámos hoje a saber que Pinto da Costa garantiu que não aceita a final da Taça de Portugal em Marrocos e que Miguel Portas entrou em todas as lojas da Baixa da Banheira e não comprou nada.

Serviço Público de Televisão!

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Nós, europeus, não fazemos a mais pequena ideia do que andamos a fazer

Em 1969, no Teatro Vasco Santana, em Lisboa, Ruy Belo proferia o seu primeiro e último discurso político. Num palanque improvisado, uma mesa coberta com um pano escuro, diante da cortina que fechava a boca de cena, o poeta terá hesitado, engolido em seco, para depois avançar, sozinho, contra a sombra da noite. A dado momento ecoaram na sala algumas frases claras e concisas: «Não sou político, não tenho ambições políticas». Com efeito, caro leitor, também eu não sou político. Quanto a ambições políticas, confesso também não trazer comigo a mais pequena ambição no bolso do casaco. Se a tivesse, ter-se-ia esfumado esta semana, onde uma onda de entusiasmo começa a enrolar o nosso entendimento, puxando-nos com a sua energia galopante: o candidato Paulo Rangel não só é um excelente candidato como estará erguendo a pulso uma magnífica campanha. Nem mais. Retumbante, definitico, indiscutível. Multiplicam-se os aplausos, preparam-se as bandeiras, encomendam-se as bebidas e os salgados, transportam-se mesas e cadeiras, desenham-se entradas gloriosas entre aplausos apoteóticos, discutem-se os alinhamentos na TV, escolhem-se as gravatas, determina-se a ordem da delcarações. A este propósito talvez valha a pena lembrar uma outra frase sintomática. Após uma polémica estéril, Eça de Queiroz escrevia a Pinheiro Chagas, esse representante do brio político-profissional oitocentista. Após uma mortal troca de ideias sobre a memória histórica da pátria, onde Queiroz era insultado como camelo por simplesmente ter subscrito a mais banal das conclusões - «que o império português do Oriente era uma das maiores ignomínias da História Universal» - afirmava o autor dos Maias, cansado de discutir banalidades com espíritos empoeirados pelos discursos parlamentares: «Meu caro Pinheiro Chagas, você não tem vontade se atirar a um poço? Eu tenho.»

Vejam este filme este fim de semana

Deflação?

Tudo aponta para que a inflação anual da Zona Euro tenha chegado ao valor histórico de 0% (segundo dados do Eurostat). Isto depois de em Abril o mesmo índice ter registado 0,6%. Esta taxa, mede a variação dos preços no consumidor entre o mês corrente e o mesmo mês do ano anterior. O valor apresentado é o mais baixo de sempre na Zona Euro.
Atingindo o ponto zero surge no horizonte a possibilidade de deflação, a diminuição relativamente longa do nível geral de preços numa zona económica. Isto, significa, que a moeda em circulação ganha valor relativamente às mercadorias, serviços e moedas estrangeiras. O que pode parecer um bom sinal para o comum dos mortais facilmente se percebe que não o é devido à possibilidade do excessivo endividamento das famílias e empresas, pois esta descida dos preços tem, paradoxalmente, repercussões negativas nos consumidores: qualquer pessoa que tenha dívidas (empréstimo imobiliário), verá o valor das mesmas aumentar, sendo que segundo o Millennium Investment Banking, acentuam-se "os receios com a possibilidade de se assistir a um cenário deflacionista no futuro próximo". Estes receios dão mais força à expectativa de cortes adicionais da taxa de juro de referência do Banco Central Europeu. Até porque "a contracção do crédito às famílias e às empresas favorecem a materialização deste cenário", remata a instituição.
Apenas como apontamento histórico e para que se tenha noção do cenário expectável por boa parte dos economistas, os três clássicos da deflação são:
- A deflação que ocorreu na Europa no final do século XIX: este período acompanhou-se de um forte crescimento económico, graças aos saltos tecnológicos da energia eléctrica e dos transportes motorizados.
- A deflação que ocorreu depois do crash bolsista de 1929: entre 1930 e 1933, os preços diminuíram 27% nos Estados-Unidos, com uma diminuição em 40% dos salários e um forte nível de desemprego.
- A deflação que ocorreu no Japão entre 1990 e 2000, ano onde a taxa directora do Banco do Japão atingiu o nível 0.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Um elogio à ignorância (dos portugueses)

Pois é, caro Alf, é hoje, que venho aqui escrever.
Já pus de parte, por 10 minutos, as minhas diarreias intelectuais para melhorar os meus poemas. Vou parar por uns instantes. Até o Porto ganhar a Taça de Portugal, acho que vou entrar em estágio e só depois, de comemorar com o nosso homem da alheira de Mirandela, é que volto àqueles "Míseros textos prosaicos".

Mas é sobre o tal nosso amigo da alheira que venho aqui falar hoje. Primeiro deixa-me dizer-te que acho que não fica bem alheira com uma imperial. Penso que é indigesto. Prefiro pensar a imperial com tremoços.
Ontem lá no Instituto onde ando, passeavam por lá uns tipos de camisa lisa e bem parecidos a distribuir panfletos e a incentivar ao voto. Estes senhores eram da JSD. Entenda-se, caro leitor, que "J" não significa juventude, mas sim movimento de "imbecialização" (palavra tecnocrata que acabou de sair do meu saber) de jovens. Muitas vezes, estas imbecializações, são fruto da auto-flagelação pensativa dos próprios jovens - tipo católico, na missa de domingo ao meio dia, antes do cozido ou da sardinhada, que ao ouvir o saber do padre fica na mesma, mas que veste a "camisola" e inspirado brama ao seu próprio ser: VAMOS LÁ!!!!!

Entretanto, e depois de chamar os tipos de reaccionários - peço desculpa ao leitor pela insistência na palavra "tipo", mas não encontrei nenhum substantivo para personificar naquele "tipo" que andava a distribuir os panfletos - começo, eu que me preocupo com a minha vida, ali, à porta do pavilhão central, reluzindo aos olhos de Deus o nome do meu instituto (IST)- mais pelo sentido do saber escravizado ao mercado, do que ao próprio saber - inicio o meu ritual de vómito àquilo que parecia um programa eleitoral digno de tremoços e de 500 barris Sagres para o povo.

Uma das medidas era: Combater a crise com os fundos europeus.
Caro Alf, aqui é que se vê que o gajo deve ir mesmo à missa, e depois come o cozido. É que isto de pedir cheira-me a prática religiosa, não? Talvez esteja errado, neste ponto, da igreja, mas acho humilhante a demagogia do senhor em querer rebaixar-nos ao ponto de pedir esmolas.
Não é que sejamos ricos, ou que tenhamos petróleo em Sines, que possa pagar esta crise, mas não está certo.

Outra frase de apelo ao voto no PSD, e ainda mais engraçada (humor desta frase não atinge, por enquanto, os malucos do Riso, ou qualquer intervenção jornalística da TVI/Manuela Moura Guedes) é esta: "Famílias Portuguesas acima das famílias europeias - assina por baixo?"
Eu assinava, caro Alf, mas não isto. Preferia assinar um atestado em que metesse o tipo, a bater com a cabeça nas paredes, para pensar um pouco. Quando é que estes tipos percebem, que o pessoal deixou de ser menos estúpido, e sabe que eles representam única e exclusivamente, os seus próprios interesses - o tal poder que todos ambicionam?

E agora, para me despedir, quero apresentar ao caro leitor, a medida mais estruturante para Portugal na Europa. Aqui, e como os dois partidos do bloco central possuem o conhecimento (não daquele que porventura precisaríamos) da visão futura para o país juntaram-se e proclamaram aos céus: "Pai nosso, nós precisamos do TGV. É aqui que Portugal pode vencer". Comentários a isto, Alf? Acho que não se precisa.

Caro Alf, finalmente parto. Porém parto com o teu lema, aqueles que enunciaste dum tal romano, aqui no blogue, de que sagradas são as armas, quando só nelas reside a esperança.
Eu, bem sei que querias mudar isto pelo saber, mas como gosto do lado bélico da coisa, prefiro as armas - são mais eficientes (desculpa este meu desabafo abjecto de reflexão).
Porém espero, que quando encontrar-mos o tal senhor, aqui por Oeiras, talvez ele nos possa oferecer uns tremoços e umas imperiais, antes das canetas, e tu ensinares-lhe alguma coisa - Eu não porque não sei o suficiente para o ensinar (risos).

Já é tarde, mas antes de ir deixo aqui apenas um texto dum senhor que descobri, graças a ti, caro Alf, que ilustra bem o que às vezes sentimos (impotência) por (ainda) não conseguirmos mudar isto:

Daniel Faria
"Para que visses"

«Para que visses
Tão sinuosos como o interior dos búzios
E o dispensar assustado dos cardumes
Os olhos já não estão
Nem eles próprios nem outros
A florir»

Haverá algo mais a dizer?


Há sempre mais a dizer, principalmente quando uma equipa apresenta um futebol com um total de 155 golos marcados, 71 dos quais pelo melhor tridente ofensivo de todos os tempos - ultrapassando o mítico record da época de 1960/1961 que fez 66 golos e contava com o hungaro Ferenc Puskas, o argentino Alfredo Di Stefano e o espanhol Luis del Sol. Tudo isto em 59 jogos, nos quais sofreu 54 golos.
A "pequena" mancha neste percurso aconteceu à pouco tempo quando na meia final ficaram cerca de 4 penalties por marcar contra esta equipa que com esse jogo totalmente desinspirado teria posto em causa a conquista do "Triplete" - nada mais nada menos que a soma da conquista do campeonato, taça e Liga do Campeões!
Na final da Liga dos Campeões, o Barça contou com um adversário confiante durante 10 minutos e que ao fim do primeiro contratempo se desmoronou. Sempre ouvi dizer que é nos grandes momentos que se vêm os jogadores fora de série...
Parabéns aos vencedores!

Resumo de tragédia grega com referencia a Eastwood agora que a tarde acaba

O bom

O mau

O vilão

A derrota sempre vencedora

Tentativa de ensaio poético logo pela manhã

O elogio


à derrota

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Scientia sexualis e João César das Neves: uma introdução, duas afirmações e uma recomendação sobre boas práticas

O caro leitor decerto reparou que o sol regressou a esta faixa atlântica da Península Ibérica. Nós, europeus, vamos engolindo algumas perplexidades, inteiramente rubros e destilados, enquanto regressamos a casa pela A5, essa sauna gigante alcatroada que a Brisa desponibiliza a cada automobilista por apenas 1,25 euros. Faz calor e o mar acalma-se na seu infinito apelo a que nos banhemos nas suas tranquilas ondas, para que, depois, saciados dos elementos, possamos receber na pele a sagração do estio, espojados nas arenosas margens do oceano. Como é dia da semana e o trabalho aperta, podemos cumprimentar, através destas singelas palavras, o Professor César das Neves por mais um refrescante texto. A prosa é longa. Contudo, o tema permite que nos alonguemos, incitando o leitor a esperar a todo o momento ligação directa ao mercado que garante sustentabilidade à rede global e, ao que parece, mantém o PIB americano em resultados aceitáveis para uma economia de mercado respeitável. O que nos diz agora o catedrático de Economia da Universidade Católica? Que os princípios de educação sexual defendidos por «um grupo de iluminados» são «aqueles que até há pouco a sociedade chamava “porcalhões”». Aqui o Professor César das Neves ilumina-se (e ilumina-nos) com o facho da verdade, levanta a lanterna e caminha: «Aspectos consensuais há milénios são momentaneamente polémicos e vivemos enorme confusão de valores e critérios». Com efeito, depois de milénios a defender «pudor, castidade e matrimónio», pelo menos desde as primeiras poeiras cósmicas, para não dizer desde os testículos do Criador, a sociedade mergulhou num Banquete Romano, em que a única coisa que não é permitida é ficar quieto. Tem razão o Porfessor César das Neves quanto fala de consenso milenar. Vejamos rapidamente de que era feito esse consenso: nas sociedades antigas, China, Japão, Índia ou Roma, generalizou-se uma ars erotica, técnica em que o prazer – fosse como prática ou como experiência - não era entendido em relação a um absoluto, sequer a um critério de utilidade, mas conforme a intensidade, qualidade e repercussões (tanto no corpo como na alma). Desde a Idade Média, esse tempo glorioso em que o homem descobriu a caixa de ferramentas ainda hoje utilizada pelo Professor César das Neves para nos acender a grande fogueira do conhecimento, as sociedades ocidentais desenvolveram técnicas de confissão, com todos as repercussões no direito penal e na organização jurídica dos poderes. Ora, nós sabemos que desde o século XVI, e não somos catedráticos, embora sentemos o rabo nas mais diversas cadeiras, que o sexo era a matéria privilegiada da confissão. Porquê? Porque este ritual discursivo se desdobrou numa relação de poder em que a instância que requeria a confissão impunha, apreciava – numa palavra – determinava, toda a verdade do sexo. Em ordem a quê? Não, decerto, em ordem a um anjinho munido de uma arpa, recostado na doce curva de uma nuvem. Não, decerto, em ordem à estrela da manhã, Maria, nossa mãe. Peço a benevolência do caro leitor, uma vez que nos aproximamos do Verão e as palavras vigorosas do Professor César das Neves acendem nos nossos corações o ardor dos bons sentimentos. Continuando a nossa tranquila viagem pelo consenso secular das verdades eternas, o que nos diz a sociedade burguesa do século XVIII, aquela que, sem apelo nem agravo, pariu César das Neves e grande parte dos restantes economistas? Desde o século XVI, uma nova forma de governo vai impôr as suas regras: nas palavras de um conhecido filósofo (esses pós-modernos iluminados pela malícia do pecado) era agora preciso analisar a taxa de natalidade, a idade do casamento, os nascimentos legítimos e ilegítimos, a precocidade e a frequência das relações sexuais, a maneira de as tornar fecundas ou estéreis, o efeito do celibato ou das interdições, a incidência das prática contraceptivas. Porquê tudo isto? Porque tal como afirmava Von Justi em 1769, e o reproduziam todos os manuais sobre polícia (governo) na Europa do século XVIII, «Os Estados não se povoam segundo a progressão natural da propagação, mas por virtude da sua indústria, das suas produções e das diversas instituições». A sociedade burguesa nada opôs ao sexo: apenas o circunscreveu, tanto numa economia do prazer como num regime ordenado de saberes científicos – os porcalhões de que fala o Professor. Porém, estes porcalhões são primos direitos dos economistas e pelos menos tão sabujos quanto eles. Não é necessário sublinhar que o peso das riquezas vai organizar-se em torno de um novo permitido e proibido, acentuando o laço entre parceiros de estatuto definido, em estreita relação com a economia: a circulação das riquezas está intimamente ligada ao corpo que produz e consome, corpo que deve ser regulado no novo espaço industrial. O catedrático levanta-se da sua cadeira forrada a púrpura e talha dourada e afirma: «A alcova substituiu a empresa e o direito à greve foi trocado pelo direito ao deboche». Aqui o Professor César das Neves dormita. Com efeito, a alcova substituiu a empresa, no mesmo momento (sécs XIX-XX) em que a absolutização dos mercados financeiros e o mundividência do prazer/consumo substituiram o direito do Estado Liberal e os valores antropológicos rurais/patriarcais em que se organizavam as sociedades do Ocidente. Meu caro Professor César das Neves: sol na eira e chuva no nabal talvez nem Jesus Cristo nos seus dias mais inspirados. Mas o Professor insiste e puxa do bolso da casaca um dardo verdadeiramente desconcertante, embebido na densidade dos factos da ciência económica e laminado com o bronze da subtileza cristã: «Os esquerdistas andam agora paradoxalmente aliados a marialvas e proxenetas». Quanto a marialvas, confesso que estive uma vez numa Igreja do centro de Lisboa a menos de trinta metros de João Braga, mas este nem vinha munido com sinais visíveis do seu sportinguismo, nem teve a oportunidade de entoar um faduncho, pelo que a acusação pertinente do Professor terá que considerar-se sem procedência. No que toca a proxeneta, devo confessar, novamente, o meu desconforto perante estes conceitos litúrgicos: não sei exactamente a raiz etimológica do termo mas aposto que rima como chupeta.

Politica de choque

Isto realmente há com cada uma...

Este tipo de coisas faz-me uma confusão enorme. Não é que a verdade desportiva interessa muito mais aos portugueses que a defesa dos direitos do trabalhadores.

Categorizem-me como quiserem mas é caso para dizer que algo está mal, muito mal mesmo cá no nosso burgo.

Enfim, soube deste facto aqui e acreditem mesmo que é chocante.

Panem et circenses minha gente, Panem et circenses.

Marinho Pinto

Um ano depois de uma campanha eleitoral marcada por opiniões reveladoras de um corporativismo exacerbado, Marinho Pinto começa a revelar-se um bom bastonário.

Em todas as estruturas organizadas, os líderes devem ter capacidade e coragem para criticar os seus pares. Marinho Pinto sempre revelara estas qualidades e agora começa a intervir nas áreas e com o tom que mais o favorecem. Não parece ser um jurista brilhante e preocupado com soluções de fundo para a justiça, mas tem características muito positivas para um líder de uma ordem profissional, em especial no mundo dos advogados.

Utiliza uma linguagem que as pessoas compreendem, intervém publicamente sobre temas relevantes, tem um discurso directo e honesto (tendo como referência as suas ideias) e não tem problema em criticar os actos de todos aqueles que entende serem merecedores de censura, incluindo os próprios advogados.

É muito importante ouvir o bastonário da Ordem dos Advogados dizer que há advogados que estão envolvidos na prática de crimes. A novidade não é o conteúdo da mensagem, que é de conhecimento geral, mas a sua discussão pública.

Os jornalistas têm um papel muito importante (talvez decisivo) na luta pela actuação responsável e ética dos nossos líderes (por exemplo, no processo Apito Dourado, o seu silêncio concertado foi comprometedor). Manuela Moura Guedes é o exemplo de um jornalista que, tal como aqueles advogados a que Marinho Pinto se refere, não pode continuar a exercer a profissão que exerce.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Prémio Carreira

Paulo Costa, em final de carreira, foi premiado com a nomeação para a final da Taça de Portugal, encontro que se disputa no Estádio Nacional (Estádio de Oeiras, segundo os jornalistas da RTP).




Uma brilhante carreira ao serviço do sistema instalado no futebol português, que culminou com intervenção directa na classificação final da segunda divisão deste ano. Esta intervenção permitiu-lhe ultrapassar em cima da meta outro grande nome do nosso futebol, Lucílio Baptista.

Ética empresarial e curso sobre gestão emocional: aqui, no Elogio da Derrota


Isto é tão estúpido

A Sony também tem lançado vários jogos destinados a uma diversão mais casual. Wegner, director de marketing da Nintendo Ibérica, admite que a rival "tem feito um muito bom trabalho em Portugal" e garante que a prioridade não é roubar jogadores a nenhuma das concorrentes (a Microsoft actua no mercado com a XBox 360). A meta é pôr mais gente a jogar: "Os jogadores têm pais, irmãos mais novos, amigos. Não queremos competir por uma fatia maior do bolo. Queremos que haja um bolo maior. Se dentro de cinco anos não for normal ver uma mulher a jogar, isso será um problema para nós".

Isto é tão ingénuo

No caso Freeport, não se trata apenas de saber se a ética, em certo momento, cedeu ou não à tentação, mas de perceber o que é isto a que em Portugal, por falta de outro termo, chamamos Estado. É um autêntico Estado de direito democrático, operando regularmente, ou o brinquedo de um clube de cavalheiros que tudo se permitem a si próprios? Rui Ramos no Correio da Manhã
O Elogio da Derrota responde com toda a simpatia: É um Estado de Direito democrático, ou seja, um brinquedo de um clube de cavalheiros que tudo se permitem a si próprios.

«Margarida, olha o que o teu pai trás ao pescoço»

Um dos traços que distinguem um licenciado em Portugal com mais de trinta anos (além da enorme aversão por qualquer tipo de compromisso cívico que implique lavagem de louça em cozinhas inprovisadas em feiras populares) é o constante tropeçar a caminho de um projecto de ironia sobre o «miserável estado da educação em Portugal». De Luciano do Amaral a Francisco Jose Viegas, passando pelo duende que guarda o mapa do tesouro, Medina Carreira, todos labutam nessa grandiosa missão de zurzir na escasso apetrechamento cultural dos "mais novos". Entretanto, as entrevistas que vão produzindo resgatam das garras desta Gomorra da ignorância a tradição sapiencial dos antigos. Se passarmos os olhos pelas colunas de opinião, como quem passa um pano encharcado pelo chão do WC, podemos contemplar toda uma panóplia de geniais indivíduos adultos de onde brota erudição, especialização técnica e dotes racionais em abundância. Recentemente, no Correio da Manhã - esse jornal erigido pela delinquência verbal adolescente - Constança Cunha e Sá escrevia: A duas semanas das eleições, é natural que chovam os habituais desabafos sobre a falta de qualidade do debate político. E que faz ela na sua crónica: elabora sobre a falta de qualidade do debate político. E acrescenta: Com o Parlamento entregue à sua insignificância, com os partidos transformados em feudos, desligados da realidade que os rodeia, com a descrença que corrói o sistema, qualquer campanha está condenada ao fracasso e ao crescimento da abstenção. Não por acaso, as Primárias das legislativas ameaçam ser as Primárias do nosso descontentamento. Isto é, na verdade, prodigioso. Os peixes nadam, a água molha, a chuva cai, Constança escreve e qualquer coisa na órbita celeste oscila e estremece, tocada pela superior educação dos nossos cronistas. Contudo, o nosso descontentamento não reside na pobreza intelectual do debate eleitoral. O nosso descontentamento decorre de não existir uma Constança Cunha e Sá que nos recitasse o horário dos comboios, dada a sua especial capacidade de: 1) produzir ideias tão esvaziadas de desacerto com o espírito do tempo que podemos acertar o relógio político através da sua voz; 2) produzir repetidamente, sem oscilações verificáves a olho nu, os mesmo conteúdos inócuos, seja em crónicas do Público, seja em entrevistas televisivas a padres reacionários, seja em escritos menores em jornais de largo espectro. Caro leitor, amanhã vestirei gravata preta em memória da qualidade jornalística nacional, problema que, se acaso ninguém reparou, talvez seja mais grave do que qualquer caso de corrupção que envolva terrenos a sul do Tejo, tios-empresários de engenheiros que estalam vidros a poder de entoar palavras em castelhanos, e intermediários ingleses capazes de produzirem onomatopeis com sotaque algarvio.

Apetece-me maçar um pouco este auditório que, diga-se em passagem, está claramente num momento de crescimento multiplicador

Henrique Raposo, num dos seus mais recentes tiros a radicais de extrema esquerda (uma espécie da caçada oitocentista na floresta de Windsor mas com muito mais casacas de setim e densidade intelectual por hectar) apontava para um texto carregado de originalidade, assinado por João Marques de Almeida: Pergunto a todos os críticos do "neo-liberalismo" se acham honestamente que num mundo mais competitivo, mais igual, onde o ocidente já não manda, será possível preservar todas aquelas funções? Se julgam que sim, digam como e deixam de atacar o "neo-liberalismo". A tese assenta sobre a crítica de uma errada simplificação que vê na crise actual uma consequência de políticas neo-liberais. Exemplo: a derrocada do Estado Social decorre da repartição da riqueza pelo mundo inteiro (faltou acrescentar: com júbilo e ao som de trombetas.)
Embora não seja um crítico do neo-liberalismo, mas sim um sebento adepto das mais ignóbeis porcarias menos de uma frase mal escrita, gostaria, se me é permitido, de tentar uma singela resposta, entre os tiros certeiros de Henrique Raposo e a perseguição dos galgos caçadores pelos prados do Grande Parque, que ladeia o Tamisa, de Sua Magestade a Rainha de Inglaterra: 1) a táctica de lançar o roto contra o nu é ainda mais antiga do que a dança da fogueira nos recônditos confortos, forrados a pele, de uma longínqua caverna - o facto das montanhas Chinesas, dos deltas Indianos, das cordilheiras da América do Sul ou das savanas Africanas, participarem na riqueza circulante não me causa qualquer espécie. Aliás, utilizando um típico argumento liberal, não são esses pobres que clamam contra o Estado social. O problema, no que diz respeito à famigerada «sustentabilidade» dos andaimes sociais, está, como sempre esteve, no problema da repartição; 2) Uma grosseira simplificação é precisamente o cansadíssimo argumento que relaciona a crise actual com o crescimento económico da Cinha, da Índia ou da América Latina, uma vez que a frequência de um qualquer centro comercial chegaria para entender a enorme complexidade do conceito de riqueza. Contudo, devemos chegar a um entendimento, pelo menos num aspecto: não se pode aplaudir a emergência dos camponeses chineses e indianos – supostamente esvaziando os bolsos das opulentas sociedades ocidentais e escavacando o modelo social europeu – para logo insultar, entre tiro de caçadeira, e uivos liberais, as aspirações dos pobres do primeiro mundo. Quem tanto fala de globalização, teima em não perceber que a circulação do capital há muito estilhaçou as fronteiras geográficas. Assim como também não será necessário sublinhar que a crítica ao modelo social europeu convive com o comércio de luxo - desde a Ferrari, passando pela Lacoste, até à Rolex – sem que se questione, por um segundo, quais os custos para o Estado – e para o contribuinte - deste comércio multiplicador de riqueza. Quanto custa ao Estado policiar uma loja da Cartier, na Baixa Chiado, que produz postos de trabalho insignificantes? Quanto fica em impostos? Quem consegue provar, nos termos da ciência económica, o custo/benefício real, numa economia global, dos benefícios fiscais concedidos a empresas que actuam segundo princípios de maximização do lucro? O que os caçadores de esquerdistas teimam em não perceber é o facto do liberalismo se basear numa dose assinalável de fé religiosa, em princípios que vão ruindo com a mesma simplicidade ingénua do socialismo soviético. Este é talvez o maior mito liberal que urge desmontar: a ideia de que existem despesas públicas e privadas, como se a economia não fosse um problema de circulação, sendo que as públicas devem ser reduzidas (elas significam uma tendência democratizante que um liberal não pode suportar) e as privadas são sempre multiplicadoras de riqueza (ignorando os custos de transacção decorrentes do desequilíbrio social que resulta da “livre” iniciativa, outro aspecto icontornável que um liberal não pode engolir sem muita agitação intestinal). O problema do Estado Social é, como todos os problemas em economia, uma questão de valor, não uma questão de orçamento.

Hoje acordei com isto na cabeça



A grande cover "badass" dos gutter twins no original do josé gonzalez

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Serviço público

Descobri via jugular o site voteWatch.eu. Este site permite ver e analisar os que andaram os deputados europeus a fazer (como votaram, que moções escreveram, etc) e veio ajudar a colmatar o meu desconhecimento no trabalho das pessoas que elegemos de vez a vez. De facto acho que está é a sensação geral de muitos portugueses que é a de não saber o que um eurodeputado faz, ou de que andam lá a encher o bolso. Talvez o golf de João de Deus Pinheiro seja um exemplo que não tenha ajudado, digamos assim.
Fiz algumas pesquisas sobre os nossos deputados e chegamos a resultados muito interessantes:
Ilda FIGUEIREDO é quem perguntou mais, falou mais, apesar de não ter estado sempre presente. Fiquei surpreendido com José RIBEIRO E CASTRO. Ana Maria GOMES é umas das melhores no PS. Mau, mau é mesmo o PSD. O pior registo vai para eurodeputada Maria da Assunção ESTEVES que além de não ter produzido lá muito trabalho, tem tempo para um site muito bonito. Só falta flores e uma musiquinha de fundo.
Aconselho a visita ao voteWatch e a perda de tempo com a pesquisa. É fundamental perceber quem de facto trabalha por Portugal e não por interesse próprio.

Olha para a minha garagem e diz-me quem sou

Já a mais valiosa garagem pertence a Nuno Melo que tem vários carros de luxo. Um Audi A4, um Land Rover Series I de 1952, um Triumph Spitfire MK III, um MGA de 1961 e um Porsche 901 Targa, compõem o património "motorizado" do democrata-cristão. Rangel também não terá problemas de motor, uma vez que é proprietário de um Mercedes 320 CDI. Quem detém menos valor sobre rodas é Ilda Figueiredo, que conduz um Ford Fiesta de 2001, Vital Moreira, que é proprietário de um Volkswagen Golf de 2005, e Miguel Portas que não declarou qualquer carro.

domingo, 24 de maio de 2009

De como nem sempre um coitadinho suburbano pode receber subsídios, perdão, convites para escrever crónicas no Expresso

O problema da criminalidade suburbana tem ocupado as administrações dos Estados liberais durante os últimos 50 anos. A tradição cinematográfica americana – mas esta gente não passou a adolescência na cinemateca –, desde West Side Story até Há lodo no cais, desde há muito elabora sobre a questão: as cinturas urbanas das grandes cidades, onde se verificam quebras nas redes identitárias (passando por dificuldades tão singelas como as diversidades linguísticas), quebras na reprodução dos empregos, quebras na articulação entre espaços públicos e educação (quantas igrejas, quantos clubes desportivos, quantas escolas de música), produzem jovens – automaticamente excluidos das competências sociais básicas – que, revelando dificuldades de adaptação (insucesso escolar, abandono efectivo da família), optam pelo custo de oportunidade oferecido pelo crime. E aqui tocamos num ponto sensível: um dos mais sofisticados teóricos do liberalismo económico e da racionalidade neoclássica, Gary Becker, identificou alguns problemas básicos, Crime and Punishment, an economic approach (1968): de acordo com uma teoria liberal esclarecida e imune às contaminações inerentes à redacção do Jornal Expresso, bem como aos editoriais inebriantes de José Manuel Fernandes, os indivíduos ponderam os custos e benefícios esperados das suas acções, decidindo a sua conduta, contrária ou conforme à lei, de acordo com uma comparação entre o resultado da sua hipotética acção criminosa e o resultado da sua integração no mercado legal, de onde resulta uma curva de probabilidade criminal a partir da apreensão dos custos da condenação, dos custos de cometer um acto ilegal e dos custos de integrar a normalidade cívica. Decidir cometer um crime – de acordo com a teoria do mercado – resulta da maximização da utilidade esperada, que é medida pelo indivíduo através dos cálculos sobre os futuros ganhos da acção criminosa, o valor da punição, e o custo de oportunidade de cometer um crime mediante o salário alternativo no mercado de trabalho. O rendimento social de inserção foi implementado a partir desta análise: aumentar os custos de oportunidade dos actos ilegais. Porém, antes que o leitor pense em assaltar a vivenda do outro lado da rua, devo alertá-lo para um texto seminal (agora sim) de Henrique Raposo, publicado no Expresso. Raposo, talvez o maior ensaista político da actualidade, senão mesmo o maior bebedor de caipirinhas liberais, identificou, com zelo patriótico e presciência abnegada, o coração do problema.

Aquilo que está em causa na Bela Vista é a eficácia das políticas sociais, sobretudo do Rendimento Social de Inserção (RSI). Nas Belas Vistas e nas Quintas das Fontes, a solução não passa por mais polícia, mas sim por menos subsídios.

(note-se o uso plural que lança, com olho de lince, a generalização, essa mãe coragem da ciência política)

As pessoas acomodam-se ao RSI. Nestes bairros, os filhos comportam-se como vândalos, porque os pais são tratados como crianças pelo Estado. Se calhar, já vai sendo tempo de tratar estas pessoas como adultos. Estas pessoas têm de ser tratadas como cidadãos, e não como cidadãos-crianças. Enquanto tiverem uma mesada assegurada (RSI), estas pessoas precisarão sempre de uma babysitter permanente (polícia em cada rua). Por outras palavras, é preciso acabar com a lógica do 'coitadinho'. O percurso dos 'coitadinhos' que vandalizam as Belas Vistas e as Quintas das Fontes é sempre o mesmo. Na escola, o 'coitadinho' bate na professora, mas como é 'coitadinho' nada lhe acontece. Na rua, o 'coitadinho' rouba uma criança 'não-coitadinha', mas como é um 'coitadinho-menor' fica impune. Quando chega a casa, o 'coitadinho-filho' repara que o 'coitadinho-pai' não paga a renda, a luz e a água. Ainda por cima, o 'coitadinho-filho' vê que este comportamento compensa, dado que o 'coitadinho-pai' continua a receber o cheque mensal do RSI. Ora, se as diversas faces do Estado (escola, polícia, município, segurança social, etc.), tratam estas pessoas como crianças durante o dia, então elas vão agir como crianças durante a noite: daí a destruição dos carros dos vizinhos, daí a queima de caixotes do lixo, daí os ataques a bombeiros e polícias - os desportos noctívagos dos cidadãos-crianças.

O Estado trata os pais como crianças. Nem mais. O que faz o português médio com as suas crianças? Atira-lhes, de acordo com um critério de alguma sistematicidade, com o seguinte repto: ou te portas bem - trabalhando nas obra da nova ponte, no serviço de caixa do doutorado honoris causa, ou na linha de montagem da auto-europa, sábados incluído - ou retiro-te o subsídio em gomas. O modelo de actuação infantil, protegido pelo Estado e denunciado por Henrique Raposo, toca no cerne da questão (toca de tal maneira que não podemos deixar de sentir um certo desconforto ao nível do baixo ventre). Se não, vejamos: normalmente, as crianças vestem-se, apressadamente, durante a noite e vão destruir os carros das crianças vizinhas, queimar caixotes de lixo dos seus amigos, atacar bombeiros e polícias lançado as suas xuxas embebidas em alcool etílico sonegado do armário da casa de banho dos país. Acresce a esta identificação da adolescência eterna das cinturas suburbanas, uma utilização prodigiosa do conceito «coitadinho». Esta é uma analítica que colhe ainda mais. Colhe porque toca no problema central da vida portuguesa com uma tal suavidade que nem José Gil, calçado com luvas de seda, atingiria tal efeito de docilidade interpretativa. Com origem na palavra coito, o coitado é aquele que sofre passivamente o coito várias vezes. O coitadinho, além disso, sofre também pelo facto da sua posição ser ainda mais inferior pela diminuição da sua dignidade. Se o Estado não o aperta bem contra a parede - no mais claro credo liberal - continuará a ser um coitadinho infantil. Contudo, perdi-me. Raposo, um liberal melancólico, encontra na origem de todos os problemas o Estado, esse monstro ignóbil. E tudo se clarifica, pela mão clarividente de Henrique Raposo. Não queremos menos Estado: queremos um Estado que aperte com eles. Com efeito, Raposo é imparável na sua capacidade de desmontar complexos problemas sociais. Mas há mais! Raposo prossegue sem baixar o nível de rigor e perícia intelectual:

A causa deste vandalismo não é a pobreza per se. (repare na utilização da expressão latina a recordar, e bem, o leitor de que quem lhe fala não é um cidadão-criança mas um erudito ancião) O 'pobre' não é um vândalo em potência. A causa desta barbárie suburbana é a falta de uma cultura de responsabilidade.

Ora aqui está.

A identidade destes jovens suportados pelo RSI constrói-se em redor do desprezo pelo trabalho.

E mais uma vez o liberalismo português, larga as amarras pesadas dos manuais da ciência económica, os estudos e as estatísticas, e larga pelo céu do virtude, desembocando num cântico às virtudes do trabalho ao som de botas de cano marchando em grandes paradas militares.

Aquele que trabalha das 9 às 5 só pode ser um 'otário', aos olhos destes gazeteiros. Aliás, "trabalho é p'ra totós" é o slogan que sustenta a identidade dos gangues suburbanos.

Slogan que o elogio da derrota, confessadamente, subscreve por inteiro. Trabalho das nove às cinco? Ainda se fosse das 10 às 4, vá lá. Ou pelo menos das nove às cinco mas com intervalo para almoço executivo no Gambrinos, seguido de uma viagem à República Dominicana (ou à Turquia) para firmar um negócio manhoso participado por duas empresas de componentes para calculadoras e uma de distribuição de apoios para rolos de papel higiénico.

Os 'piores' vêm sempre de famílias encostadas ao subsídio. Lamento, mas é assim. Não me odeiem por eu dizer isto. Odeiem a realidade, porque eu estou apenas a apontar para um facto. Não acreditam? Então experimentem fazer antropologia suburbana durante quinze dias.

Por nós, preferimos fazer antropologia urbana em redacções de jornais de referência e gabinetes de investigação na área da ciência política: são pacíficos, adultos, responsáveis, não consomem verbas ao Estado, fazem bem ao espírito e tornam esta maçadora e perigosa vida numa tranquila viagem (sem custos), pelas maravilhas raras do exotismo indígena português.

Nós, Europeus, escrevemos muitas vezes no Google a palavra «Mulheres», «Benfica», «Resultados do Euromilhões», «restaurantes», «paraísos de sonho»

O PS escolheu cedo o seu principal candidato e rapidamente colocou na rua um cartaz para o dar a conhecer, sob o lema 'Nós, europeus'. Um lema cujo significado sintetiza bem o resultado de mais de 800 anos de história e de duas décadas e meia de integração europeia, numa afirmação clara daquele que é o nosso espaço natural. Marcos Perestrello, Expresso; Maio de 2009
Pedimos desculpa ao Marcos Perestrello mas estamos apostados numa campanha de divulgação do nosso lema e, como não temos cartazes, temos que recorrer a terrorismo informático. Posto este esclarecimento sobre títulos e técnicas de liderança, passamos, rapidamente, ao que interessa. Nós, Europeus, nascidos em Portugal, podemos todos os dias contemplar o lema do PS, entalados numa rotunda, enquanto buzinamos furiosamente contra um camião, ao serviço da distribuição de fruta, que ultrapassa pela direita, e um taxista, conduzindo uma velinha afundada em sacos, que ultrapassa pela esquerda. E o que diz esse lema? Que nós, europeus, mas portugueses, sintetizamos bem 800 anos de história (800 anos de história bem sintetizados entre o sovaco direito mal perfumado, e a hérnia discal provocada pelo transporte da bilha do gás). Por outro lado, somos o resultado de duas décadas e meia de integração europeia. Logo, integramos, durante duas décadas e meia, aquele que é o nosso espaço natural. Resumindo, temos 800 anos de história mas só integramos, numa afirmação clara, o nosso espaço natural hà duas décadas e meia. O que nos conduz à ideia (natural) de que durante 775 anos estivemos a afirmar com a clareza dos ribeiros minhotos, e de uma forma afirmativa - José Mourinho style -, a nossa pertença à Europa. Daí que Marcos Perestrello não precise de nos relembrar no Expresso que o PS espalhou cartazes, afirmando de forma clara (sustentados por duas décadas e meia de integração e 800 anos de história) que nós - os mais agéis empilhadores de paletes por tudo quanto é cais manhoso nos portos do mundo inteiro - somos, na verdade, europeus.

Ou, por outras palavras, soube organizar a moscambilha com uma limpeza cristalina

«O que impressiona no FC Porto moderno é a sua capacidade de se reinventar. Inventou, nos anos 70, num contexto social histórico específico, uma identidade futebolística muito particular e soube, depois, através dos anos, perceber a evolução dos tempos e reinventá-la (ou adaptá-la) em novos contextos sociais e desportivos mesmo quando as suas idiossincrasias de origem se desvaneceram.» Luís de Freitas Lobo, Expresso, 24 de Maio de 2009

Perguntará o caro leitor o significado destas linhas. Em primeiro lugar, a importância da estrutura. Em segundo lugar, a importância de se não fazer a mais pequena ideia sobre a elaboração de conceitos para se poder ser cronista desportivo. Em terceiro lugar, o fascínio perante a articulação entre contexto sociais históricos específicos e idiossincracias de origem que se desvanecem. O que sobra desta analítica breve? A tremenda eficácia dos cursos de expressão escrita orientados por Manuel Machado em toda a faixa litoral entre Espinho e Vila do Conde.

«Nada se perde por mais que aconteça/ uma vez que já tudo se perdeu»



Mantorras não é um jogador de Futebol. Mantorras não é um atleta de alto rendimento. Mantorras não encaixa no perfil exigente do futebol-indústria. Há muito que os comentadores deixaram de poder compreender o futebol, preocupados em salvar a tosta e a cerveja. «Alegria do povo» ou «força da natureza» são ridículas aproximações a uma evidência – tão cristalina que chega a cegar quem dela se aproxima com pés demasiado velozes. Mantorras é um homem que atravessou a guerra, tocou o ouro do Olimpo (momentos houve em que esteve referenciado pelo Barcelona) e mergulhou na apatia dos sonhos perfurados pelos dias. Até aqui, uma narrativa igual a tantas outras. Mas no momento em que as rodas do destino embalam para a curva derradeira (convidando Mantorras a desaparecer numa divisão secundária, apoiado pelo sindicato, com aparições esporádicas em programas sobre velhas glórias juvenis) alguma coisa encrava a engrenagem funcionária da normalidade (o animal espeta finalmente os cornos no destino). É então que o jogo se suspende – há muito que vitória ou derrota deixaram de fazer sentido quando Mantorras entra em campo – e o homem caminha glorioso sobre os seus próprios pés. O rastilho que se acende nas bancadas – inflamando a turba – não é nenhum carisma obscuro. As crianças esticam-se em bicos de pés, olhando por cima das cabeças dos mais velhos. Não é nenhum contágio simbólico (entre as acácias vermelhas de Luanda e as papoilas rubras de Lisboa). E os velhos sentam-se cerrando os punhos, quando regressa ao corpo uma energia antiga. Mantorras é um homem que triunfou da própria vida – dobrando com os pulsos a lógica do alto rendimento e a aritmética da eficácia -, no mais cruel e efémero dos palcos da vaidade.

sábado, 23 de maio de 2009

Economia de Mercado 0 Marinho Pinto 1

O que espanta no recente confronto entre uma Máscara do Carnaval de Torres Vedras e o Bastonário da Ordem dos Advogados é o facto de não ter acontecido mais cedo. Não há dúvida de que a competição gera eficiência. Se não, veja-se a ascensão meteórica da qualidade jornalística da televisão portuguesa depois da abertura do sinal ao investimento privado. O recrutamento dos quadros das novas televisões teve a seriedade de uma debulha de milho no Verão beirão: aqui vai feijão e quem agarrar primeiro é que vai dançar o baile com a moça mais jeitosa da aldeia. Posta esta analítica rural dos colaboradores do espaço mediático - Ana Lourenço deve ser a mais bonita nulidade jornalística a sul do Danúbio -, deve ainda salientar-se o comprado assentimento dos Portugueses: movidos a telenovela - cujo mote é invariavelmente um conjunto de gemidos disfarçados de canção, atribuídos a Paulo Gonzo - e a futebol - onde pontificam os comentários escatológicos de Rui Santos (oráculo do Senhor) - os telejornais lá vão produzindo candidatos ao poder ou oposição inflamada, conforme sopra o vento no milharal (ou a espiga tem bicho ou vamos dançar ao arraial).

António Veloso e história do cinema: problemas e interpretações

Tenho constatado que a morte de João Benárd da Costa tem servido de pretexto a tutti quanti para se declararem frequentadores da Cinemateca desde pequeninos. Desde confessos antigos estudiosos da 7ª arte (Henrique Raposo) até iniciados estéticos deDreyer (Pedro Lomba) toda a minha santa gente tem entoado cânticos às suas memórias da Cinemateca. Ele são salvíficas fugas dos bancos da Faculdade (o que explica muita coisa), ele são tardes de deleite na contemplação de Rio Bravo. Por mim, sempre achei a cinemateca um lugar repelente onde certo dia me cobraram 5 euros por um folhado de queijo de cabra com bróculos (eu que o vivi é que dou testemunho), repleto de indivíduos caracterizados por camisolas caneladas inquietantemente chegadas ao corpo, coroados por óculos de massa. Além desta bizarra fauna, o lugar distingue-se ainda por uma proverbial infestação de candidatos a crítico, sem paralelo em qualquer latitude portuguesa (à excepção, talvez, de Serralves). Não tendo pistola para sacar quando oiço falar em Cinemateca, deixo apenas um convite à introspecção: que relações entre a juvenil frequência da Cinemateca e a produção de ensaios políticos inoculados com a genialidade do liberalismo democrático de filiação anglo-saxónica? Mas não se aflijam. O problema tem cura. Trinta e seis horas de visionamento da final da Taça dos Campeões Europeus de Viena de 1989 (com repetição do penalty de Veloso, pelo menos 1047 vezes). Como é sabido, o Benfica defrontava o clube de futebol neerlandês Philips Sport Verening Eindhoven, fundado a 31 de Agosto de 1913 por um grupo de operários da fábrica Philips. O desfecho foi fatal para os lisboetas e encheu de regozijo a classe operária, poucos meses antes da queda do Muro de Berlim. É garantido: não há paralelo dramático na história do cinema.

O Fim do Mundo aqui tão perto

A polícia, com o sentido de intervenção pedagógica a que já nos habituou, entrou num bairro de Cascais (sim, as imagens são de Cascais!) e contribuiu um pouco mais para o nosso bem-estar.
Uma evidência esquecida: Do outro lado da notícia, na noite fria ou quente, no dia desgastante e tenso, pessoas e vidas existem e continuam a existir sem as câmaras. Intervenções destas, com gás pimenta ou palavras secas, vão alimentando o ódio e a vontade de vingança.
Até posso acreditar que há bons e maus. Mas também não duvido que, chegados ao Fim do Mundo pela manhã, a maioria não é nem boa nem má. É o que é e será o que fizerem dela (e por ela). Quando chega a hora de almoço, já passou a manhã toda e, com ela, ventos muito variados. Ao início da tarde, já nada é igual, porque não só a manhã foi longa, como também se sente o almoço. A tarde é outro Mundo e o jantar nova aventura... A noite cai no Fim do Mundo e...

São portugueses, coitadinhos

Colina veio dar um seminário sobre liderança. Liderança. Pior, só mesmo um seminário sobre lavagem de bróculos. Organizado pela Optimus Negócios, o encontro deve ter raiado a estratosfera. Rui Moreira desfez-se na habitual subserviência a árbitros que nunca contactaram com fruta ou café com leite. Colina ouviu a apresentação do doutor Moreira e afirmou, depois, querer contratar o presidente da Associação Comercial do Porto, e moderador da sessão, como seu agente de imprensa. "Disse coisas de mim que eu nunca tinha ouvido...", brinca. De facto, não há como nós a ajoelhar perante o disparate. Não há como nós a vender a banha. Não há como nós a narrar o conto do vigário. Não há como nós a fingir seriedade, enquanto equilibramos pratos coloridos ao som da corneta. (Aplausos).

A ultrapassagem de Marx

A propósito do doutoramento honoris causa do engenheiro Belmiro de Azevedo: note-se de passagem o empreendorismo latente que vem já comportado no nome «Belmiro». O facto de alguém se chamar Belmiro é já uma vantagem comparativa assinalável. Sem desistirmos, queremos assinalar as declarações de Marques dos Santos da Faculdade de Engenharia. O ilustre reitor afirmou que Belmiro "É um excelente exemplo, criou riqueza, criou emprego. Se cada um olhar para aquele modelo e procurar fazer o mesmo, certamente que a riqueza no país será maior". Com efeito, continua a surpreender-me este conceito de riqueza. Se criarmos riqueza, Portugal será mais rico. Mas se a economia liberal, ou socialismo democrático - o que é a mesma coisa - possibilita um desenvolvimento comum, resta a pergunta: mas rico em relação a quê? Rico em relação a quem? Se todos ganharmos 1000, que grandeza pode ser atribuída a este 1000? Se todos ganharmos amanhã 50, não será aquele que ontem ganhava 500 mais rico do que um outro que ganhava 300 quando todos ganhavam 2000, mas infinitamente mais pobre do que um terceiro que ganha 5 quando todos passaram a ganhar 1? Para quando a constatação de a riqueza é sempre uma relação de forças? Para quando a constatação de que o valor não é da ordem da paz mas tem a sua natureza fundada na guerra?

Crise de consciência e modernidade tardia

O caro leitor não deve ter deixado de reparar na consagração académica que hoje teve lugar na Universidade do Porto. Antes de elaborar o seu veemente protesto, saiba que não me move nenhuma animosidade anti-capitalista. Apenas não gosto de basófia. E Belmiro de Azevedo, entre duas tiradas sobre a importância do trabalho - e quatro cânticos à humildade das gentes nortenhas - é um monumento vivo à basófia do novo-rico. E não há empreendorismo, nem multiplicação de postos de trabalho - muito obrigado senhor engenheiro -, que disfarcem a raiva de quem julga poder comprar com o reconhecimento público, o que o dinheiro, ou mesmo a ascendência social, nunca poderá conferir. Há pouco tempo Álvaro Pereira, um recém-conhecido economista, vituperava Portugal por não aclamar Belmiro de Azevedo como um homem de excepção. Se fosse nos EUA - afirmava - Belmiro seria coberto com o manto púrpura dos triunfos e recebidos com folhas de palma pela multidão. Ora aí está como Portugal sabe assemelhar-se ao primeiro mundo. Chegou o reconhecimento da Academia. O doutorado confessou: "realizei projectos, enfrentei desafios, venci obstáculos e, chegado a este meu Outono, olho à distância e admito que deixei algumas pedras brancas para sinalizar o caminho das gerações futuras". E nós que não realizamos projectos, fugimos aos desafios e estamos ainda na nossa singela Primavera, desconfiamos sempre de quem nos sinaliza o caminho. Com efeito, poderão chamar-nos marxistas, esquerdalhos ou simplesmente irresponsáveis mas não julgamos que hipermercados e telemóveis sejam propriamente razão para consagrações. Se o capitalismo é apenas o resultado da libertação económica, a perseguição do interesse próprio, porquê celebrar num homem a soma enriquecedora das trocas económicas de toda uma sociedade? Ou será o capitalista, afinal, o aristocrata de um regime cujas sedes do saber já ajoelham, de mão estendida, na esperança de serem poupadas à vertigem irracional do poder?

quinta-feira, 21 de maio de 2009

Tempo de Novas Oportunidades

Não é novidade alguma: a vida é feita de oportunidades. Depois há outras coisas: por um risco, na trave, por uma unha negra, quase; por uma sorte dos diabos, só me acontece a mim. Agora, conforme o anúncio televisivo, as oportunidades são únicas. Sobre o seu sucesso desconfio, mas aceito: pelo menos fazem correr primeiros e ministros aos domingos de manhã. Ora foi precisamente depois de um desses dias, nos quais vou correr, que por entre uma mudança de canais mais ou menos rápida tenho a oportunidade de assistir a uma conferência de Fernando Henrique Cardoso, o ex Presidente do Brasil. Não discuto aí opções ideológicas, fujo da política mais intima do Brasil e corro a instalar-me de facto em frente à TV. Diz Henrique Cardoso "que algo de novo tem que ser criado. E tem que ter alguma utopia para inventar o futuro". Assim, claro, sem engasgos nem bolo rei. É verdade que nega o futuro a Marx; mas vai mais longe, ao que interessa, à necessidade de reinventar o papel do Estado, o fazê-lo renascer do ataque neoliberal. Mas que Estado defende FHC? ." O Estado tem que ter um papel maior. Tem que ter. Mas que Estado? O Estado democrático. Se o Estado for totalitário, também não resolve. E esse Estado democrático hoje exige participação da sociedade, mecanismos de parceria, órgãos de Estado e não de governo." Fala, depois, nos porquês da necessidade de reescrever este Estado, numa frase, simples, sem rodeios: para fazer uma melhor redistribuição da riqueza.
Foram só 40 miutos. Mas claros.
E de que falam os políticos (?) portugueses "com responsabilidade"? De nada, nem do passado - obviamente não podem - nem do presente, nem do futuro, porque não fazem ideia do que isso seja, ou melhor, talvez continue a acreditar nos milagres de um mercado que se auto-regula.
É tempo assim, aqui assim, de NOVAS OPORTUNIDADES, as quais não sei, mas desconfio, lá para o fim do verão.


Contrastes


Is life good?

Quando, finalmente, as imagens e o tempo deixam de passar


Os carreiros que rasgam o corpo da serra são misteriosos e eu nunca me aventuraria não fosse o desejo de regressar a lugares de onde se avista a vastidão do mar. Não existem coisas transcendentes que expliquem a passagem do tempo no nosso corpo. Não será nesses caminhos que algum dia avistaremos mais claridade do que aquela que temos recebido, cada dia, quando percorremos labirintos de avenidas ou trepamos por elevadores a colinas de cidades cosmopolitas. De um lado a palavra, do outro a imagem. No centro, a desesperada esperança de que seja possível tocar alguma coisa, lá, do outro lado da noite.

No dia em que o cinema em portugal ficou mais pequeno

«Só se chorando, mas já assentámos que não.»

É com esta intenção que vão ser construídos, no Alto da Boa Viagem, um hotel de cinco estrelas com 350 quartos, do grupo Vila Galé, e um aparthotel com perto de 100 quartos, de um dos maiores grupos hoteleiros de Lisboa. Para esta zona está também prevista a construção de um pavilhão multiusos, que poderá servir como alternativa ao Pavilhão Atlântico. Este terá a capacidade para 8 mil pessoas em eventos culturais e 4 mil em eventos desportivos.
O turismo de negócios é um dos principais incentivadores à construção de novos equipamentos na região, o que se deve à presença de grandes empresas multinacionais nos centros empresariais de Oeiras. Como tal, vai ser também construído um novo centro de congressos com maior capacidade na Quinta da Fonte, que será uma parceria público-privada. Perto do Tagus Park, mais concretamente em Porto Salvo, está a ser construído o Porto Salvo Golfe, cuja gestão será do Espírito Santo Turismo. Neste local vai ser construída também uma unidade hoteleira de três ou quatro estrelas.
Na zona ribeirinha de Oeiras, nas Fontainhas junto ao passeio marítimo que se encontra em fase de conclusão, vai ser construído também um hotel junto à praia. Mais à frente, perto da marginal, localiza-se o antigo Palácio dos Arcos, património municipal, que vai ser reconstruído, “para manter viva a sua memória”, sustenta Carlos Oliveira, e vai transformar-se num hotel de charme.
Um dia, sentado na bancada da piscina do Jamor, por motivos que não vêm ao caso, lia prolongadamente um livro de Virgílio Ferreira - um velho professor, como todos sabem, zangado com o mundo. A certa altura dispara uma personagem: «só se chorando, mas já assentámos que não.»

Explicação de uma insuficiência política que o desastrado autor destas linhas remata com uma referência ao poeta

Roma sempre pagou a traidores. Desde o primeiro dia, a variação semântica da traição foi já uma espécie de comércio com a moral. «Sagradas são armas quando só nelas reside a esperança» registou em tempos um velho historiador do Império, chamado Tucídides. O que valida a santidade das acções é a sua eficácia: e, assim, nasceu o que chamamos a modernidade. Alguém fez contas e obteve mais trigo do que aquele que gastou o seu tempo a considerar o movimento das oliveiras e as ondas sucessivas de uma seara percorrida pelo vento. Desde sempre, tudo sempre se comprou e se vendeu: o que muda, o que sempre tem mudado, são os modos de pagamento. E desde sempre os traidores foram sendo coroados, quer pela riqueza que o seu comércio das coisas foi acumulando, quer pela turba que explodiu em aplausos perante a metálica violência daqueles que nasceram, nascem, com o selo da vitória. De qualquer modo, desde o Liceu havia por vezes um bando de aves em passagem pelo azul pérola do céu - uma cortina de seda de súbito atravessada pela luz - um pedaço de névoa que subia da barra e ia rodear a outra margem do rio destacando, em formas rigorosamente nítidas, os contornos das falésias sépia. O rio parecia então estrangulado pelas margens, esmagado pelo peso do céu que desabava, uma vezes carregado de nuvens cinza, outras vezes dilatado pelo movimento lento do sol qur tudo vinha tingir de fogo. Por vezes, os meus olhos fixavam-se num homem de cabelo ralo - óculos desajustados com a moda e uma expressão aflita, uma expressão de quem errou a porta de saída - um homem recortado contra uma parede de granito, numa expressão de súbita alegria como quem ao longe visse anunciar um sentido para coisas que jamais aceitarão a mais ténue sombra de sentido. Momentos havia em que, na sala de aula, vindas de longe, ecoavam considerações sobre as variáveis de um problema para o qual não encontrava solução, enquanto os meus olhos percorriam insistentemente a folha de um livro aberto sobre a secretária: «este meu ódio visceral contra mim mesmo/ este meu profundo amor pela arte».

Será, de facto, que Roma não paga a traidores?

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Derrota TV

Acabo de inaugurar aqui ao lado um espaço dedicado ao vídeo e à derrota. Uma forma de elogio multimédia. Como hoje é dia de final de taça uefa, escolho a final de há uns anos atrás. Aquela que o sporting perdeu em casa. A derrota que há de ficar para sempre.

A ética católica e o espírito do capitalismo

Segunda a Lusa, o Grupo de Oração do Renovamento Carismático da Vigaria de Almada (GORCVA), colaborador da organização das comemorações do cinquentenário do Cristo Rei, vendeu quinze mil velas e cinco mil terços mas sublinhou no final da cerimónia que "os números podiam ser o dobro se os vendedores ambulantes não tivessem feito concorrência". A estimada representante do Grupo afirmou ainda: "Acabámos por não vender tanto quanto esperávamos","Nestas coisas há sempre oportunistas. Muitos fiéis compraram velas e terços a vendedores ambulantes, achando que estavam a ajudar as paróquias. Foram baralhados". Com efeito, foram duplamente baralhados. Em primeiro lugar, porque compraram objectos religiosos não confirmados oficialmente e, segundo, porque compraram objectos religiosos numa das mais idiotas celebrações colectivas de que há memória na história da humanidade. A imagem de Nossa Senhora visitou o Cristo Rei. Segundo fontes oficiais, foi a décima saída da Imagem da Capelinha das Aparições, sendo que a sexta ocorreu no ano da inauguração do Monumento a Cristo Rei, em 1959, momento em que foi concretizada a consagração de Portugal aos Corações de Jesus e Maria. Ninguém reparou mas, entretanto, levámos com uma guerra colonial no bucho, uma revolução falhada, uma tentativa de democratização agonizante, e duas maiorias absolutas atribuídas a indivíduos que, manifestamente, não tiveram a inteligência iluminada por qualquer sagrado coração. Das duas uma: ou falhámos na consagração ou alguém estava a fazer figas com muita força.

Juro solenemente, e com a graça de Deus, não existir qualquer relação entre a pobreza e a criminalidade


Eu, por acaso, prefiro de longe a ficção

O que espante nos dias que correm não é o facto de existerem indivíduos deslocados. Sempre os houve. Não é sequer a crítica da modernidade: dizemos sempre que hoje se verifica isto como se ontem não se tivesse verificado aquilo. Em qualquer dos casos, o que espanta é a forma como ainda nos conseguimos supreender com o facto de vivermos rodeados por medíocres. É que nós ainda não compreedemos inteiramente como fazemos parte dessa mediocridade geral. Ainda não vislumbrámos, com o rigor e a calma devida, a limitação medíocre que nos corre nas veias. O que espanta mesmo é como alguma vez tenha sido possível acreditar que fossemos mais do que o mundo confuso que nos rodeia.

É isto o maior ensaísta político da actualidade?

A realidade é muito mais gira do que a ficção
Nos EUA, está a ocorrer um babyboom. É só meninos por todo o lado. Explicação? Com os apagões provocados pelos ciclones, a malta ficou sem nada p'ra fazer. Vai daí, toca a fazer meninos. Sem electricidade, somos todos umas Cicciolinas em potência.
por Henrique Raposo às 09:58 no Clube das Repúblicas Mortas

O melhor do mundo não são as crianças, são os nossos poetas de ocasião

Depois de António Variações ter procurado sintetizar a sua arte pop na famosa frase: «Procuro construir alguma coisa entre Nova Iorque e a Sé de Braga», eis que António Marinho Pinto alarga novos horizontes, sugerindo que, por vezes, em Portugal se exige que as decisões sejam consultivamente apoiadas no maior número de opinadores possível o que lembraria qualquer coisa entre um Soviet e um Arraial Minhoto.

Ia mesmo agora comentar o caso da Professora de História mas lembrei-me que tenho uma aula de História para dar dentro de dez minutos

O mais recente número cómico da actualidade implica uma relação de causalidade não-linear com as célebres entrevistas de Ruy Belo a Maria Teresa Horta publicadas, salvo erro, pela primeira vez, aí pelos anos 60. O poeta pergunta retoricamente: «sabe qual é o livro mais perigoso?»; e logo a entrevistadora replica: «A Bíblia». Ora, mais perigoso do que a Bíblia só mesmo uma aula sobre cultura clássica no contexto da Roma imperial. Que a senhora padece de um enervamento latente não há dúvida. Que as aulas tenham sido qualificadas como espectaculares também não me suscita qualquer inquietação neuronal, até porque, como é sabido, quanto mais louco o Professor mais vertiginosa a viagem pelas encostas do saber. Levanta-se o «Portugal vitoriano», em peso, logo auxiliado pelo Portugal sacro-profano que, entre duas telenovelas pornográficas e três assaltos à inteligência protagonizados pelo Presidente da República, descobre, no fundo do saco oferecido nas promoções do hipermercado, o valor da discussão moral. A questão reside em saber, depois da eventual suspensão da docente em questão, qual a pena a aplicar aos chefes de redacção que acharam neste relevante acontecimento matéria de interesse jornalístico. Eu sugiro o visionamento de vinte horas do programa «Esta Canção é para ti» protagonizado por Manuel Luís Goucha e Júlia Pinheiro, com o volume do televisor no máximo, apenas com a permissão de curtos intervalos – de dois minutos – em que se lhes conceda a hipótese de renegarem a sociedade de consumo, a fim de alcançarem uma vida purificada de palavrões e alusões grosseiras à sexualidade, conceito que, lembre-se com a devida importância que o caso merece, não deve ser confundido com sexo.

Em torno das alusões a orgias

Ora aqui está um tema interessante para primeiro post no blog.
A Ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, que aparentemente não conhece bem o caso, não demorou a qualificar o comportamento da professora, dizendo não ser este corrente, normal e regra.
José Carvalhinho, personagem ímpar entre os seus pares, dispensa apresentações. Pensando melhor, talvez não as dispense para já! Trata-se do presidente da Associação de Pais daquela escola e, como é natural, aponta o dedo à professora, acusando-a de falar de sexo “em termos inapropriados”.
Os alunos defendem a professora, considerando-a espectacular, o que é deveras (e a palavra deveras não está aqui por acaso) suspeito, tendo em conta aquilo que consta da acusação. Parece que a professora terá sido vítima de alguns alunos, caindo na armadilha por estes montada, com recurso à arma mais poderosa do Mundo actual.
Nem uma palavra sobre o facto de um aluno ter gravado uma conversa na sala de aula, ter publicado essa conversa na Internet e contactado os jornalistas e estes, por sua vez, terem publicado a notícia e tornado públicas declarações que de público (e de interesse público) nada têm.
O país ganhou tema para a indignação de que necessita como alimento (justificada, porque as palavras da professora ultrapassam realmente os limites da ética), mas perdeu mais um pouco de confiança, tranquilidade e alegria, rumo ao controlo total de tudo e de todos.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Há quem diga que o futebol é isto mesmo

Rui Santos e Pereira Cristovão já confirmaram ter estado, durante a tarde de terça-feira, a coligir informação para o anunciado best-seller que preparam em comum - «As novas tecnologias e o seu efeito em cabelos encaracolados que coroam cabeças pouco dadas ao esclarecimento: que futuro».

O futebol é tão mais simples

Dias Ferreira agredido, alegadamente devido à sua pretensão de se candidatar à presidência do Sporting.

É tão triste e melancólico viver na era da ciência

Hey there! Vital moreira is using Twitter.
não é sem emoção que se dá a última aula de um ano lectivo, de onde acabo de sair, na fduc. from web

Acabei de dar uma pequena entrevista ao Rádio Clube sobre a minha entrada no Twitter.
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A todos bom dia. Obrigado por terem aderido a este novo canal de informação.
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Amanhã entre as 17h30
Hey there! E tem a precisão estilística de um camionista a interpretar Chopin duas grades de minis depois.

A papa liberal é estranha

Ora bem, fui visitar este blog de papistas (mais do que o papa) e encontrei este texto que dedico especialmente ao Alf pela sua recente paixão pelo Henrique Raposo (talvez devas começar a ler o João Gonçalves também):

"O Henrique é um filho não pródigo da propriedade horizontal, o sonho de qualquer pequeno burguês dos anos setenta que, muito legitimamente, não entende por que é que não se há-de andar de casa em casa, a preços módicos mensais, com vista para o Tejo."

Depois de ler estas linhas, confesso que não conseguir comer mais daquela papa e fui ler o Record

Estamos verdadeiramente tramados

No dia 23 de Maio o caríssimo leitor não deve perder de vista um acontecimento da mais alta relevância: o Fórum Portugal de Verdade, organizado pelo PSD. Entre as mais variadas variações ao desnorte total podemos ler as seguintes linhas:

Em suma, o Fórum Portugal de Verdade será um espaço de compromisso do PSD com a verdade, com o país e com os portugueses.

As faixas gráficas do símbolo representam um caminho que combina a motivação laranja do partido com o verde da esperança de dias melhores para os portugueses. Um caminho que nos aponta para um único sentido: o da verdade.

O "V" da Vitória, que mais do que um gesto é um símbolo com história no PSD, conjugado com o V da Verdade transmite a ideia base da identidade do Fórum com a certeza de que só a verdade nos levará à vitória e que só a vitória do PSD levará o país a vencer os tempos difíceis que vivemos.

Este é o momento decisivo para que os portugueses, e também os partidos, demonstrem que há alternativas e que podem verdadeiramente ser alternativa. Alternativas de diagnóstico. Alternativas de políticas. Alternativas de soluções. Alternativas de protagonistas.

Chegou a hora da Verdade.

São duas imperiais e uma alheira de Mirandela, por favor


Se Portugal fosse um país a sério o Pacheco Pereira seria um lenhador da Letónia encarregue de fornecer a lenha ao Pai Natal

Obviamente, esta questão da criminalidade na Bela Vista é, como tantas outras, um problema de consciência. Consciência no sentido em que a vida a determina. Quem nunca entrou (pelo menos três vezes) num bairro social, quem nunca se viu rodeado dos tais delinquentes (tanto para festejar um golo como para levar uma tareia) que vá aumentar o PIB.

É mais ou menos isto

Sonata para dois pobres, em sol menor, seguida de aplauso em pé (durante pelo menos dois minutos)

Segundo Pacheco Pereira, "Os pobres não fazem carjacking, não se armam com uma caçadeira e não vão assaltar bancos, bombas de gasolina, ourives e ourivesarias, e caixas multibanco, para comprar roupa de marca." Não, os pobres não fazem isto. Quem faz isto são os filhos dos pobres, seja na Bela Vista, na Quinta da Fonte, em Rio Tinto ou na Ribeira.
No Expresso deste sábado, publiquei este pequeno ensaio sobre a Turquia e a UE, Henrique Raposo.
Publicou um ensaio, diz ele, e nós, que o conhecemos, explodimos num aplauso perante frases como esta: Em Novembro de 2008, tive oportunidade de passar uns dias entre a elite de Istambul (jornalistas, produtores de TV, etc.) a convite destes senhores (leia-se associação da Amizade luso-turca, ou qualquer coisa deste género. E nós, que não viajamos a convite de senhores, a menos que estejam munidos de uma caçadeira e venham da Bela Vista, aplaudimos o passeio por Istambul, enquanto entoamos mais um cântico à produtividade nacional e ao zelo vigilante no ambiente de trabalho.

O texto do momento

Pedro Magalhães, no Público desmanchou Pacheco Pereira. E escreve lá coisas muito boas. Ide ler:

"Mas numa coisa Pacheco Pereira tem razão: deste e doutros pontos de vista, Portugal não é mesmo um país a sério. Se fosse, eu não teria de ter escrito este artigo."

Aviso à navegação

Houve aqui uns pequenos ajustes no elogio à derrota. Uma alteração pequena no layout. Tivemos também a entrada de novos reforços que estão cheios de vontade de participar. Aos poucos a derrota vai assumindo a sua inevitabilidade, e apenas nos resta o rescaldo da jornada. Como diria o sábio da bola: prognósticos só no fim do jogo.

O Rio de Janeiro continua lindo

Venho por este meio - e sem a mais pequena hesitação - declarar solenemente - colocando a cabeça, as duas mãos e um chouriço de Arganil no cepo da probidade intelectual - que confirmo não existir a mais ténue sombra de relação entre a criminalidade (benzendo-me três vezes e cuspindo no chão) e a pobreza, essa chaga social que apenas se adequa a portugueses longamente martirizados que se levantam às seis da manhã, obedecem cegamente todo o dia, e terminam a labuta baixando a cabeça perante a exploração, perdão, perante o desenvolvimento económico do país. Aliás, a título de prevenção da saúde pública portuguesa, declaro também que, passando a semana passada pela Quinta da Marinha no meu Renault Clio de 1991 (luz da temperatura acesa, porta direita ligeiramente amolgada e problemas de travagem), fui violentamente interpelado por um crimimoso (polo Lacoste e sapato timberland) munido do seu taco de golfe que, suspendendo a minha marcha atirou sem mais: «passa para cá já essa camisa verde contrafacção da feira de carcavelos e esse carro de merda que eu adoro sentir a emoção que sentem os briosos portugueses que ganham menos de 1000 euros e tenho um Iate à espera ali na Marina». Repondi: «mas o que é isto?»; ao que ele replicou: «isto é um assalto que me foi agora mesmo inspirado sem sombra de determinação materialista nem arremeso de esquerda socializante ou marxista».
Posto isto, abandonei o meu Clio ao doutor Vasconcelos e Souza que, cumprimentando-me, arrancou a toda a velocidade pela estrada do Guincho, uivando contra o Estado de Direito, a segurança dos cidadãos e a respeitabilidade da Polícia, ao som da Frei Hermano da Câmara e brandindo o seu punho esquerdo contra o vento que soprava do lado da Serra de Sintra. Ainda corri mas fui impedido pelos dois advogados do doutor Vasconcelos e Souza (com Doutoramento em Direito Administrativo em Coimbra - não há também a mais pequena relação entre delinquência violenta e escolaridade) que arremetidos pelo mesmo espírito do crime - que sopra onde de quer - me espancaram violentamente por entre vivas à Exposição Internacional do Cavalo na Golegã.
Sem mais a declarar, eu, um estúpido qualquer.

Um pouco de paz

Andamos nós aqui a discutir a política e como havemos de mudar de rumo, para que de facto vivamos melhor, mas achei oportuno postar este vídeo. Sugiro assim, que o caro leitor desfrute do melhor do humor nacional, ao sabor dum café nespresso e duma bolacha muesli digestive (como eu), para desfrutar deste bom vídeo e que depois volte ao assunto político.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Talvez seja tempo de experimentar o machado (ou o martelo pneumático)

500 mil desempregrados, um magnífico resultado de mais de 30 anos de paradigma socialista/social democrata. E depois há gente que ainda quer mais Estado. Se calhar, é tempo de experimentar outra coisa.
por Henrique Raposo às 15:17 (Clube das Repúblicas Mortas).



Há já algum tempo que venho alertando o caríssimo leitor para o rigor extremo na utilização de conceitos como «Estado», «Público», «Privado». Há, evidentemente, taxistas e costureiras que laboram neste erro. Contudo, eu tenho a solução! Se a todos os portugueses fosse concedido o privilégio, que digo eu, a satisfação devida de participar num curso de ciência política, seguido de um mestrado em Relações internacionais (incluindo estágio na Cova da Moura, seguido de experiência profissionalizante na redacção do Expresso) tudo seria mais claro. Como água cristalina a jorrar das profundezas do granito. Que estas coisas das relações e da ciência querem-se como a política (profundas e cristalinas).

Economia global

Recebi esta história por email:

Numa pequena vila em que nada de especial acontece, a crise sente-se. Toda a gente deve a toda a gente, carregada de dívidas. Subitamente, um rico turista entra no pequeno hotel local. Pede um quarto e coloca uma nota de 100€ sobre o balcão, pede uma chave do quarto e sobe ao 3º andar para inspeccionar o quarto que lhe indicaram, na condição de desistir se não lhe agradar. O dono do hotel pega na nota de 100€ e corre ao fornecedor de carne a quem deve 100€. O talhante pega no dinheiro e corre ao fornecedor de leitões a pagar 100€ que devia há algum tempo. Este por sua vez corre ao criador de gado que lhe vendera a carne que por sua vez corre a entregar os 100€ a uma prostituta que lhe cedera serviços a crédito. Esta recebe os 100€ e corre ao hotel a quem devia 100€ pela utilização casual de quartos à hora para atender clientes. Neste momento o turista desce à recepção e informa o dono do hotel que o quarto proposto não lhe agrada, pretende desistir e pede a devolução dos 100€. Recebe o dinheiro e sai. Não houve neste movimento de dinheiro qualquer lucro ou valor acrescido. Contudo, todos liquidaram as suas dívidas e agora a população desta vila já encara o futuro com optimismo.

No dia em que sabemos que isto e isto eram inevitáveis face aos últimos meses, depois de ler esta história já começo a ver o futuro com aparente optimismo