Em 1969, no Teatro Vasco Santana, em Lisboa, Ruy Belo proferia o seu primeiro e último discurso político. Num palanque improvisado, uma mesa coberta com um pano escuro, diante da cortina que fechava a boca de cena, o poeta terá hesitado, engolido em seco, para depois avançar, sozinho, contra a sombra da noite. A dado momento ecoaram na sala algumas frases claras e concisas: «Não sou político, não tenho ambições políticas». Com efeito, caro leitor, também eu não sou político. Quanto a ambições políticas, confesso também não trazer comigo a mais pequena ambição no bolso do casaco. Se a tivesse, ter-se-ia esfumado esta semana, onde uma onda de entusiasmo começa a enrolar o nosso entendimento, puxando-nos com a sua energia galopante: o candidato Paulo Rangel não só é um excelente candidato como estará erguendo a pulso uma magnífica campanha. Nem mais. Retumbante, definitico, indiscutível. Multiplicam-se os aplausos, preparam-se as bandeiras, encomendam-se as bebidas e os salgados, transportam-se mesas e cadeiras, desenham-se entradas gloriosas entre aplausos apoteóticos, discutem-se os alinhamentos na TV, escolhem-se as gravatas, determina-se a ordem da delcarações. A este propósito talvez valha a pena lembrar uma outra frase sintomática. Após uma polémica estéril, Eça de Queiroz escrevia a Pinheiro Chagas, esse representante do brio político-profissional oitocentista. Após uma mortal troca de ideias sobre a memória histórica da pátria, onde Queiroz era insultado como camelo por simplesmente ter subscrito a mais banal das conclusões - «que o império português do Oriente era uma das maiores ignomínias da História Universal» - afirmava o autor dos Maias, cansado de discutir banalidades com espíritos empoeirados pelos discursos parlamentares: «Meu caro Pinheiro Chagas, você não tem vontade se atirar a um poço? Eu tenho.»
1 comentário:
Estimado,
Há esperança. A julgar pelos comentários dos seus apoiantes no dia após a sua apresentação no Café Nicola, o homem afinal tem defeitos e parece que é humano.
Eu pessoalmente não confio nele. Quando foi a questão do enriquecimento ilícito, à tarde absteve-se de votar a lei no parlamento mas à noite estava a zurzir forte e feio no PS. Concorde-se ou não com a proposta de lei, isto é desonestidade pura. O Diabo está nos pormenores
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