O mais recente número cómico da actualidade implica uma relação de causalidade não-linear com as célebres entrevistas de Ruy Belo a Maria Teresa Horta publicadas, salvo erro, pela primeira vez, aí pelos anos 60. O poeta pergunta retoricamente: «sabe qual é o livro mais perigoso?»; e logo a entrevistadora replica: «A Bíblia». Ora, mais perigoso do que a Bíblia só mesmo uma aula sobre cultura clássica no contexto da Roma imperial. Que a senhora padece de um enervamento latente não há dúvida. Que as aulas tenham sido qualificadas como espectaculares também não me suscita qualquer inquietação neuronal, até porque, como é sabido, quanto mais louco o Professor mais vertiginosa a viagem pelas encostas do saber. Levanta-se o «Portugal vitoriano», em peso, logo auxiliado pelo Portugal sacro-profano que, entre duas telenovelas pornográficas e três assaltos à inteligência protagonizados pelo Presidente da República, descobre, no fundo do saco oferecido nas promoções do hipermercado, o valor da discussão moral. A questão reside em saber, depois da eventual suspensão da docente em questão, qual a pena a aplicar aos chefes de redacção que acharam neste relevante acontecimento matéria de interesse jornalístico. Eu sugiro o visionamento de vinte horas do programa «Esta Canção é para ti» protagonizado por Manuel Luís Goucha e Júlia Pinheiro, com o volume do televisor no máximo, apenas com a permissão de curtos intervalos – de dois minutos – em que se lhes conceda a hipótese de renegarem a sociedade de consumo, a fim de alcançarem uma vida purificada de palavrões e alusões grosseiras à sexualidade, conceito que, lembre-se com a devida importância que o caso merece, não deve ser confundido com sexo.
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