quarta-feira, 2 de julho de 2014

Entre o conservadorismo e a Lana Del Rey, o público, graças a deus, não hesita.

João Pereira Coutinho assinou recentemente a defesa pública do conservadorismo. Mas o público, sem tempo para perder tempo com inovações (a alfabetização das massas ou a leitura de livros) pergunta desconfiado: o que é o conservadorismo? Não se pode explicar isso num minuto? Temos mesmo de comprar o livro?

Para sossego das consciências modernas, respondo: claro que não. Devo dizer, antes de mais, que é muito estimulante circular numa República onde 80% das personalidades públicas resultam de um belo efeito de conservação, sendo que não basta, a conservador que se preze, esse simples efeito de conservar a sua posição inicial de pessoa bem nascida. Não, não, de modo algum. O conservador procura por todos os meios espalhar o germe da conservação, ficando, por exemplo, o pobre republicano, socialista e laico espantado com o facto de o conservador pretender dirigir-se a um público para conservar o estado de coisas. Não seria melhor, se o objectivo é conservar, manter o silêncio? Daqui resulta um sinistro paradoxo, ao pretender o conservador alterar a situação do público em relação a uma situação inicial específica (ou seja, o conservador não convive bem com o facto de o público poder permanecer ignorante absoluto do que seja a conservação). Em geral, o conservador não se perturba com estas contradições, pois conserva também vários amigos cuja conservação o leva a escrever em jornais (esses instrumentos da conservação) e livros (objectos frutos da conservação do manuscrito) esforçados no gesto de convencer quem os rodeia de que devem conservador aquilo que a todos nos mantém de joelhos perante os conservadores.

Assim, o monumental João Pereira Coutinho, ilustre cientista (oi) político, publicou, na sua versão portuguesa, um belo manual sobre conservadorismo, não se lembrando que a simples publicação do seu livro constitui uma retumbante refutação dos méritos do conservadorismo. Como apelidar estes frutos da incapacidade de os conservadores se conservarem como estão, calados, preferindo os conservadores dirigirem-se aos outros para os convencer a não conservarem a sua ignorância sobre o que os conservadores têm para dizer? Bem, não temos resposta para esta pergunta, mas creio que as coisas na Universidade estarão cada vez mais difíceis.

Não conheço as origens específicas da família Pereira Coutinho (resistindo eu contra todas as pulsões lunáticas do meu sistema nervoso que me levariam a investigar de onde raio saiu o João Pereira Coutinho para chegar depois à landscape da conservação). O desconhecimento das origens intelectuais de João Pereira Coutinho não nos impede, contudo, de nos maravilharmos com os necessários e inegáveis méritos da conservação, pelo menos durante alguns minutos, mesmo que diante de uma certa perplexidade, tendo em conta a multiplicação de conservadores alojados nos sovacos de uma instituição conservadora, como a Universidade Católica, cuja conservação se deve a esse grande conservador, Jesus de Nazaré, um gajo com tal capacidade de conservação que resolveu pregar-se a duas tábuas cruzadas para ver quanto tempo aguentava conservado na mesma posição.


Lana Del Rey

Lana Del Rey, conservando os braços abertos em posição crística.

1 comentário:

condenado disse...

Só há uma coisa que sou capaz de conservar: a virgindade!
Será que esse Coutinho ainda a conserva? Há que lhe perguntar, cara***.