Poder-se-ia dissertar sobre as oscilações exibicionais do jogador representado na imagem. Ou pder-se-ia elaborar sobre os desejos que temos de fingir amar os pedaços de identidade de que somos feitos. O valor de uma coisa é ou não medido pelos seus resultados. É vedadeiro o amor votado às coisas, ou, como escreveu um dia Sebald, alguns de nós estão condenados a amar violentamente as coisas pequenas e inúteis, torturados pela incapacidade de se libertarem das imagens, das longas listas acumuladas no tempo: as caixas com soldados de chumbo, os berlindes, um lenço de seda que pertenceu a um avô emigrado, um livro de piratas, um colar de conchas, duas chaves antigas, um cromo de Gary Lineker, o caderno da terceira classe. Alguns de nós passarão o resto dos dias procurando ordenar estas coisas. Mas não são precisos muitos anos para chegar a um ponto de não retorno, isto é, para entender como a guerra se inscreve sempre no nosso tecido muscular, esvaziando as coisas do seu valor nominal, sem que reste senão o valor de uso. Em todo o caso, nada há de mais permanente na história do tumultuoso progresso do mundo do que o ódio que os literatos cultivam entre si. Não conhece barreiras regionais ou linguísticas, não conhece consciência de classe ou sensação de pertença, não conhece desejo ou redenção. Não foi preciso muito tempo para ecnontrar num texto de um famoso crítico português a afirmação de que os textos de Sebald são comparáveis a uma narração portuguesa sobre solares minhotos ou a participação de Joaquim Paço de Arcos em companhias da Zambézia. A questão que preocupa aqui não é a valorização sobre Sebald, o seu valor no mercado literário, mas saber o que pensar da próxima vez que se abrir uma crítica de Eduardo Pitta sobre o que quer que seja. Deus me guarde, de dia e de noite, na eterna protecção dos seus braços e vigilante bondade dos seus olhos, das iras do escritor frustrado.
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