quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

O conflito das interpretações III

Passamos então a explicar. O papa proferiu há alguns anos um discurso em Parma. Não é possível repôr na íntegra esse discurso mas aqui fica o excerto recolhido no blogue Ratzinger:

La crisi della fede nella scienzatratto da Svolta per l'Europa? Chiesa e modernità nell'Europa dei rivolgimenti, Paoline, Roma 1992, p. 76-79.
"Nell'ultimo decennio, la resistenza della creazione a farsi manipolare dall'uomo si è manifestata come elemento di novità nella situazione culturale complessiva. La domanda circa i limiti della scienza e i criteri cui essa deve attenersi si è fatta inevitabile. Particolarmente significativo di tale cambiamento del clima intellettuale mi sembra il diverso modo con cui si giudica il caso Galileo. Questo fatto, ancora poco considerato nel XVII secolo, venne -già nel secolo successivo- elevato a mito dell'illuminismo. Galileo appare come vittima di quell'oscurantismo medievale che permane nella Chiesa. Bene e male sono separati con un taglio netto. Da una parte troviamo l'Inquisizione: il potere che incarna la superstizione, l'avversario della libertà e della conoscenza. Dall'altra la scienza della natura, rappresentata da Galileo; ecco la forza del progresso e della liberazione dell'uomo dalle catene dell'ignoranza che lo mantengono impotente di fronte alla natura. La stella della Modernità brilla nella notte buia dell'oscuro Medioevo (1).
Se qui entrambe le sfere di conoscenza vengono ancora chiaramente differenziate fra loro sotto il profilo metodologico, riconoscendone sia i limiti che i rispettivi diritti, molto più drastico appare invece un giudizio sintetico del filosofo agnostico-scettico P. Feyerabend. Egli scrive: «La Chiesa dell'epoca di Galileo si attenne alla ragione più che lo stesso Galileo, e prese in considerazione anche le conseguenze etiche e sociali della dottrina galileiana. La sua sentenza contro Galileo fu razionale e giusta, e solo per motivi di opportunità politica se ne può legittimare la revisione» (2).
Dal punto di vista delle conseguenze concrete della svolta galileiana, infine, C. F. Von Weizsacker fa ancora un passo avanti, quando vede una «via direttissima» che conduce da Galileo alla bomba atomica. Con mia grande sorpresa, in una recente intervista sul caso Galileo non mi è stata posta una domanda del tipo: «Perché la Chiesa ha preteso di ostacolare lo sviluppo delle scienze naturali?», ma esattamente quella opposta, cioè: «Perché la Chiesa non ha preso una posizione più chiara contro i disastri che dovevano necessariamente accadere, una volta che Galileo aprì il vaso di Pandora?». Sarebbe assurdo costruire sulla base di queste affermazioni una frettolosa apologetica. La fede non cresce a partire dal risentimento e dal rifiuto della razionalità, ma dalla sua fondamentale affermazione e dalla sua inscrizione in una ragionevolezza più grande. [...] Qui ho voluto ricordare un caso sintomatico che evidenzia fino a che punto il dubbio della modernità su se stessa abbia attinto oggi la scienza e la tecnica".
(1) Cfr. W. Brandmüller, Galilei und die Kirche oder das Recht auf Irrtum, Regensburg 1982.
(2) P. Feyerabend, Wider den Methodenzwang, FrankfurtM/Main 1976, 1983, p. 206.© Copyright 1990-2008 - Libreria Editrice Vaticana


Ora, não restam dúvidas. Foi mesmo Bento XVI que afirmou que a fé não cresce a partir do ressentimento e da recusa da modernidade. Estava a referir-se às posições de Feyerabend e de Weizsacker que empreenderam reflexões contra o absoluto da ciência. Qualifica mesmo Feyerabend como “filosofo agnostico-scettico”. E porquê? Porque o autor de agaisnt the method revê (e não defende) as posições da Igreja seiscentista contra Galileu apenas do ponto de vista das particularidades da vivência das populações contra um racionalismo cego que se pretende impôr com Galileu. Se o director Fernandes tivesse perdido algum tempo a ler Feyerabend teria percebido que sua crítica assenta sobre a recusa de racionalidades englobantes e unívocas (como as defendidas por Bento XVI). A racionalidade totalitária (recorrente ao longo da história) expressa-se hoje pela ciência. Equivale a uma ideologia representando hoje o papel que o cristianismo desempenhou na sociedade ocidental. É sugestivo que o capítulo se intitule “crise de fé na ciência”.

O que nos conduz ao significado do protesto dos universitários. Não sei se interpretaram correctamente ou não o discurso de Bento XVI. Provavelmente não. Sei que o consideraram intelectualmente inconsistente. Sei que estão no seu pleno direito de o considerar e de expressar por escrito no seu abaixo-assinado a recusa de que venha proferir o discurso inaugural. É curioso como o liberalismo do senhor directos Fernandes, de Pacheco Pereira ou de Pulido Valente, seja um liberalismo, como sempre, selectivo. A menos que todos tenhamos ficado subitamente ingénuos, tanto os universitários, como Feyerabend, sabem que os discursos são lugares de poder. Que a escolha de um Papa para o discurso é um sinal claro mas precisamente do contrário do que afirmam Fernades, Pereira e Valente. É inegável que há um retomar social fortíssimo do peso da Igreja. Precisamente por isso surgiram os protestos na Universidade de Roma. Não terá lembrado a estes pensadores que quem não tem poder talvez não motive reacções.

Para grande pena do director Fernandes, Bento XVI, não foi agredido, os seus livros não foram queimados, a sua liberdade não foi coarctada. Apenas se ouviram vozes (escritas a tinta em pedaços de lençol) que desmente os lugares comuns todos os dias repetidos pelo poder das televisões e dos jornais quase de forma unânime. Ratzinger “é um dos grande intelectuais da actualidade” repetiu pela enésima vez Fernandes. Os Universtiários de Roma apenas disseram: nós recusamos essa racionalidade, porque temos uma outra visão do mundo. Aqui na Universidade é o nosso espaço, um dos últimos redutos contra a alinça ideológica totalitária do liberalismo parlamentar, todos os dias defendida pela rançosa versão ocidental do cristianismo de domingo de manhã.

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