Caro leitor, a vida é um imenso palco, um jogo de dados, uma canção efémera, um mercado de alfaces. Não podia ser de outra maneira ou o tédio talvez nos sepultasse. O tédio ou os juros bancários que nestes dias balançam como o galo no campanário da igreja. Sabemos que o jogo tem inclinações, ritmos, tendências acentuadas, virtualidades e arbitrariedades: jogar é ter experiência com o acaso. Contudo a economia não é um jogo, é uma ciência, uma teoria nas palavras do senhor engenheiro Miral Amaral. Há que jogar e não esperar mais que o resultado da jogada. O perigo é talvez que o jogo não corra bem, talvez que a jogada não seja a mais apropriada ou pior… talvez a nossa vida não esteja adaptada ao acto de jogar. A questão, caro leitor, está em saber quem joga mal. Ou quem possui os atributos do jogo. Não falo de quem define as regras porque cheira a humanidades. Antigamente os homens jogavam à malha no adro da igreja. Os cãos da velha quinta ladravam ao longe, as flores dos plátanos, tal como os juros e os galos dos campanários, balançavam no vento. Por vezes um homem acendia o cigarro no frio de Dezembro e efregava as mãos uma na outra. A vida era então como a trajectória dessa malha - viva e precária antes de caída.
Hoje, a vida não é um jogo. A vida é a economia de mercado, no sentido em que é norteada por conceitos modernos, pensados, reflectidos, contruídos. Quando há já alguns dias convidavamos o director Avillez de Figueiredo para que avançasse, sabiamos, caro leitor, que ele avançaria mais tarde ou mais cedo. Mas sabiamos como? perguntará o caro leitor. Sabiamos com toda a evidência que há na realidade das coisas que, com efeito, são coisas. O mundo económico é, verdadeiramente, uma grande coisa. Em primeiro lugar há players. Tipos que jogam ou são jogados ou agarram-se ao jogo para que não joguem por eles. Depois há relações de mercado:
Um tipo diz – é a 20
ao que responde o mercado – não é não senhora, é a 15,5
e o tipo novamente – é a 19,95 se não levas já com este malho na cabeça
e o grande mercador – aqui não vale malhos, quanto muito chamas a polícia
e o tipo novamente – é a 19, 999 que é para pagares a despesa da polícia
e o mercado – está bem senhor engenheiro.
Estas relações de mercado são transparentes e conferem aos players oportunidades de desenvolvimento pessoal e colectivo. Esta semana no programa negócios da semana (SICnotícias) o senhor engenheiro Mira Amaral era confrontado – com tudo o que isto significa de pueril diante do continental saber do senhor engenheiro – com a diferença de informação no acesso ao crédito. O raciocínio do jornalista da sic era, como é bom de ver, igualmente pueril: como lidar com o problema da contratualização de produtos de crédito nas instituições bancárias uma vez que nem todas as famílias têm a mesma capacidade de aceso à informação e, consequentemente, de negociação. Responde o senhor engenheiro:
- É a vida.
Na verdade, é de facto a vida. Como em tudo, explicava o senhor engenheiro, é a vida. Repare o caro leitor que o senhor engenheiro tem toda a razão. Um tipo vai na rua e aparece um outro com um malho (aquele mesmo do mercado, por exemplo). Nisto o gajo do malho dá com ele na cabeça do segundo tipo que responde incrédulo e abalado
- Ai que me estão a matar.
- É a vida (diz o gajo do malho).
Por falar em jogo é conhecido o incidente com o líder do Movimento Compromisso Portugal António Carrapatoso. De acordo com o Diário de Notícias em 2006, a Direcção-Geral de Contribuições e Impostos (DGCI) deixou caducar uma alegada dívida de António Carrapatoso respeitante a rendimentos auferidos pelo presidente da Vodafone em 2000:
"A notificação do contribuinte devia ter sido feita até 31 de Dezembro de 2004, mas só aconteceu em 2005. De acordo com o mesmo jornal, um funcionário das Finanças terá colocado no sistema informático que a liquidação foi feita ainda em 2004, mas sem qualquer documento que o comprove. O presidente da Vodafone apresentou uma reclamação, alegando a caducidade do direito à liquidação e o Fisco acabou por lhe dar razão, acrescenta ainda o Diário de Notícias.»
Parece que no Expresso o mesmo senhor director e ilustre líder, António Carrapatoso, afirmou que «se se alimenta um sistema destes, vale mais a uma empresa fugir aos impostos do que ser competitiva para conseguir mais retorno». Nem mais. Esta concepção institucional da acção política do cidadão é verdadeiramente relevante. Pois que permite novas leituras sociais. Um economista da cova da moura afirmou ontem ao Expresso: “se se alimenta um sistema deste mais vale um gajo roubar uma ourivesaria e fugir à polícia do que trabalhar nas obras para ganhar 500 euros”. De maneira que a polícia entabula (bela expressão) neste momento denodados esforços para prender este economista da Cova da Moura.
Como compreenderá o estimado leitor a vida é como um jogo, que decerto correrá bem, especialmente se tivermos um malho na mão. O problema é que nem todos somos estúpidos e há por vezes inadaptações ao terreno de jogo, players que fazem entradas por trás, golos com a mão e até mesmo, pasme-se, agressões sem bola.
Voltando ao assunto que aqui nos trazia a noticia do expresso on-line não deve ter deixado os players indiferentes:
Martim Avillez Figueiredo, director do "Diário Económico", será nomeado director da Sonae SGPS, com as funções de de coordenação das relações institucionais do grupo e gestão da Marca. O senhor director Avillez seguiu as indicações do Alf e avançou. Em boa hora o fez porque desta forma, segundo o Expresso «Paulo Azevedo dá mais um passo na reestruturação interna que está a promover, desde que subsituiu o seu pai à frente da "holding"». Portanto tudo continua em bom ritmo na monarquia.
Convém esclarecer o auditório que não nos move qualquer especial preconceito contra a monarquia Sonae. Apenas gostamos mais da República e continuamos a achar que os impostos são uma forma de intervenção política. Cheira a bolor? Pois é, música dos anos oitenta…Consequências para o tecido empresarial? Não sei, a vida é um jogo.
O expresso noticiava ainda que o senhor director se despedia «num tom emocionado» classificando os seus três anos à frente do “Diário Económico” como «“electrizantes”. O ainda director acrescentou, também, que o seu “trabalho só foi possível com a extraordinária equipa do 'Diário Económico', que provou que um jornal pode conciliar o rigor e a profundidade da informação com a criação de valor”».
A criação de valor é um outro dado importante da economia. Temos além dos players e do mercado, o valor – outro conceito de grande significado para nós. Para esclarecermos melhor este magnífico conceito podemos lançar o olhar ao que escreve o colunista, do diário económico on-line, Ricardo Costa que assina a crónica “Um chá no deserto”. De maneira que o meu gato salta da janela e pergunta:
- Este não é aquele da sicnotícias e do expresso da meia-noite, onde já esteve algumas vezes o senhor director Avillez?
- É (respondo com ironia perante a inaceitável ignorância do meu gato em assuntos de comunicação).
Temos que o senhor director sicnotícias Costa é colunista no diário económico e convida o senhor director do diário económico Avillez para comentador no programa do sicnotícias do senhor director Costa. Ao que chegamos ao conceito final da economia: a diversidade de informação. Temos em suma players, mercado, criação de valor e diversidade na informação.
Quanto à coluna do chá no deserto eu diria que é mais um champagne na savana.
Foi então que entrou Ruy Belo, um dos que não conseguiu emprego e infinitamente pesa sobre a economia, ou como é mais comum dizer-se – um lírico -, proclamando com voz forte o seu lirismo:
E entretanto tudo a noite rodeou e o jogo acabou
e pelo céu do tempo houve um homem que passou
ou uma certa malha arremessada por acaso à vida
e viva na precária trajectória antes de caída.
1 comentário:
1. - Humanidades: Certamente o alf já
ouviu falar daqueles rios que, de repente, "desaparecem" para tornar a "aparecer" mais adiante. Não desespere! "La vieille taupe creuse toujours"!
2.- Economia/Ciência: Já levo 34 anos de Economista, e cada vez me convenço mais de que não é uma ciência; é um discurso que arrebatou para si vestes de ciência, para confundir os papalvos... Quem topa bem a Economia e os economistas é o Vasco Pulido Valente, que os compara à medicina e aos médicos do séc. XVIII, com as suas sangrias e sinapismos... Apesar das suas irrepreensíveis credenciais académicas, ninguém o leva a sério - nesta matéria... Nem o enorme VPV está ao abrigo da baixa da cotação das Humanidades...
3.- Ruy Belo - Uma questão muito subjectiva: valerá a pena ser um "looser" em vida confiando no julgamento despreconceituoso dos vindouros? Hesito na resposta. Mas, enquanto hesito, penso na coragem e integridade necessárias... Não é para qualquer um!...
4. - Humanidades II - Um empurrãozinho nas ditas será dado por pequenos acontecimentos cheios de Humanidade como o concerto de Natal da Ermida... Há que reconstituir as redes do convívio humano - não esquecendo nunca que estamos no séc XXI... Senão... gulp!...
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