É importante perceber porque esta cagada é efectivamente uma cagada.
Porque todo o texto tem um sabor a reportagem antropológica sobre uma tribo perdida na Amazónia, feita enquanto a autora matava tempo até abrirem as lojas do Sablon e da Avenue Louise. É uma falta de respeito por quem lá vive.
Porque é uma caricatura de um bairro e como tal, apoia-se em esterótipos e preconceitos. É tão idiota caracterizar Molenbeek como um viveiro de terroristas, como é dizer que aquilo é tudo gente de bem. Para criticar certo tipo de esteótipos, a Fernanda Câncio limita-se a utilizar outra classe de estereótipos.
No 40 miutos que estive na Bourse, com um custo monetário de 2.30€ em estacionamento, fui entrevistado pela CNN para a América Latina, estiveram estes marmanjos a gritar e a fazer confusão, nas escadarias da Bourse discursava um senhor, presumo que, paquistanês, ao meu lado estava uma tuga a cortar na casaca de uma colega de trabalho e atrás estava um negro a beijar o BI belga enquanto uma criança loirinha desenhava a giz corações no alcatrão. Para além da minha presença na Bourse e os 2.30 € por 40 minutos de estacionamento, que mais poderemos dizer sobre estes 2400 segundos que não sejam absolutas banalidades sociológicas ? Não será antes preferível o reconhecimento da nossa ignorância, seguido por um esforço continuado em atenuar a dita ?
domingo, 27 de março de 2016
quarta-feira, 23 de março de 2016
Vénia profunda a Dostoievski, um dos poucos que sabe escrever sobre a locura
O mais difícil para mim, neste dia pós atentado, tem sido eu descobrir em mim uma sede de sangue, de vingança. Passo o tempo a discutir comigo próprio, porque não agarrar numa kalash e varrer Molenbeek a chumbo. Ou então, ir esta sexta-feira largar granadas numa das mesquitas de Bruxelas. Ou fazer uma visita aos familiares dos terroristas. Ou....
Eu sei que é errado. Eu sei que provavelmente seria até contraproducente. Eu sei que depois de derramado o sangue, não é possível voltar atrás. Mas não consigo calar esta sede de sangue.
Também sei que daqui a uns dias, volto à normalidade. Foi assim em Novembro, quando Bruxelas foi fechada durante um fim-de-semana fechada. Foi assim aquando os ataques de Paris. Mas até lá cohabita em mim um ser medonho.
Eu sei que é errado. Eu sei que provavelmente seria até contraproducente. Eu sei que depois de derramado o sangue, não é possível voltar atrás. Mas não consigo calar esta sede de sangue.
Também sei que daqui a uns dias, volto à normalidade. Foi assim em Novembro, quando Bruxelas foi fechada durante um fim-de-semana fechada. Foi assim aquando os ataques de Paris. Mas até lá cohabita em mim um ser medonho.
quinta-feira, 3 de março de 2016
Carta aberta à minha própria estupidez.
Aos desiludidos com o silêncio retroactivo sobre o assunto do momento, tenho respeitosamente a declarar a minha falta de jeito para as simplificações. A partir do momento em que começo a ser arrastado para a lama, fruto da estupidez sempre galopante em todas as matérias consideradas virais, reservo o direito de subir à minha torre de marfim, e apagar qualquer vestígio sobre tão deprimente figura e assunto. Fizeram de um parvo, publicamente agressivo contra pessoas e instituições, e atrevidamente ignorante, um mártir da liberdade de expressão. Com que então, um cronista de um dos jornais de maior tiragem, com acesso a televisões, financiado por uma das instituições culturais mais ricas do país, alçado a combatente pela liberdade, passou a ser apresentado como intelectual perseguido e silenciado? Ao que chegamos. Só nos últimos dois dias, já vi três novos textos do referido «silenciado» em três órgãos de comunicação social de grande tiragem (para não falar dos directores de jornais, televisões, revistas, políticos, jornalistas, almirantes, poetas, empresários, farmacêuticos, que logo correram a fazer soar as trombetas do alarme, em solidariedade com a vítima do povo em armas). Para isto, contribuiu uma incrível falta de inteligência, a começar por mim, mas sobretudo de todos os que. estupidamente, correram a insultar e a ameaçar a figura, da forma mais desajeitada e selvagem possível, incluindo na caixa de comentários deste blogue.
De um simplificador boçal e cheio de si mesmo, fizeram um herói da coragem literária e da biografia pessoal. Pois bem, não contribuirei mais para essa inacreditável perversão dos factos. Por estar nos antípodas do estilo e substância de um autor como Henrique Raposo, só posso vir a público reconhecer o meu erro. Quem sabe não terei ajudado, fruto da ironia mal compreendida, a incendiar algumas consciências. Quem sabe não terei contribuído para as tristes ameaças e insultos, e muito pior, para a construção do mártir. Só posso nesse caso fustigar a minha própria burrice e incapacidade.
A melhor forma de combater os estúpidos, é ignorar a estupidez, eis um princípio estrutural de uma boa vida, que teimo em não aprender. O controlo (e a proeminência) no espaço mediático pertence invariavelmente aos brutos, insensíveis e ignorantes. Os mais críticos de si mesmos, inteligentes, sensíveis e delicados com os outros e os seus problemas, afundam-se na incapacidade de resistir ao caos, à falta de sentido do mundo. Os mais cuidadosos e responsáveis acabam torturados pela sua consciência, perdidos e assustados no labirinto de consequências e desastres criados no seio da sua poderosa (desgovernada?) imaginação. Hesitam até à paralisia, diante da enorme variedade dos imprevistos humanos, receosos de terem prejudicado indevidamente alguém, triturados na máquina de esconder a injustiça a que chamamos realidade.
Talvez se possa chamar a isto cobardia. Ou cansaço de viver.
De um simplificador boçal e cheio de si mesmo, fizeram um herói da coragem literária e da biografia pessoal. Pois bem, não contribuirei mais para essa inacreditável perversão dos factos. Por estar nos antípodas do estilo e substância de um autor como Henrique Raposo, só posso vir a público reconhecer o meu erro. Quem sabe não terei ajudado, fruto da ironia mal compreendida, a incendiar algumas consciências. Quem sabe não terei contribuído para as tristes ameaças e insultos, e muito pior, para a construção do mártir. Só posso nesse caso fustigar a minha própria burrice e incapacidade.
A melhor forma de combater os estúpidos, é ignorar a estupidez, eis um princípio estrutural de uma boa vida, que teimo em não aprender. O controlo (e a proeminência) no espaço mediático pertence invariavelmente aos brutos, insensíveis e ignorantes. Os mais críticos de si mesmos, inteligentes, sensíveis e delicados com os outros e os seus problemas, afundam-se na incapacidade de resistir ao caos, à falta de sentido do mundo. Os mais cuidadosos e responsáveis acabam torturados pela sua consciência, perdidos e assustados no labirinto de consequências e desastres criados no seio da sua poderosa (desgovernada?) imaginação. Hesitam até à paralisia, diante da enorme variedade dos imprevistos humanos, receosos de terem prejudicado indevidamente alguém, triturados na máquina de esconder a injustiça a que chamamos realidade.
Talvez se possa chamar a isto cobardia. Ou cansaço de viver.
quarta-feira, 2 de março de 2016
A vida é curta mas não podemos recuar diante dos grandes dilemas da humanidade.
Na sequência da vaga de fundo irreprimível, vamos voltar a publicar a nossa entrevista fictícia (e satírica) e repito, entrevista fictícia, ou seja, inventada (ficou claro?) ao ilustre Henrique Raposo, mártir da liberdade de expressão.
Henrique Raposo, obrigado por nos ter recebido aqui em sua
casa. Antes de mais, sabendo da sua relação amor-ódio com o Alentejo, pergunto:
como é viver em Lisboa?
Henrique Raposo, cronista do Expresso, licenciado em
História, investigador em Ciência Política, homem desassombrado, considerado
provocador, atacado pela esquerda, bastião da liberdade. Fomos entrevistá-lo a propósito do seu mais
recente livro, Alentejo Prometido, no contexto desta recente polémica. A obra incendiou as redes
sociais e alegadamente, um grupo de alentejanos
já considerou a hipótese de invadir o local de apresentação do livro, apimentando o evento com uma carga
de porrada bem distribuída, e fazendo jus à acusação de que o Alentejo é uma
terra de violência, num estado de pré-guerra.
Sabe, viver em Lisboa é excelente, as pessoas confiam imenso
umas nas outras e as raparigas usam variadas vezes a palavra violação,
sobretudo para descrever os preços das saladas vegetarianas.
Henrique, já que fala nisso, deixe-me ir direito ao assunto.
Durante a sua polémica participação no programa Irritações da Sic Radical
afirmou: «as alentejanas antigas não têm a palavra violação para descrever os
abusos que sofriam. Ele chegou-se ao pé de mim e pronto».
Isso foi mal interpretado pelas redes sociais, aliás, as
pessoas, burras e esquerdistas como são, neste país socialista, atrasado e
cheio de alentejanos, tendem a interpretar mal as minhas lições de vida. Eu
próprio, ao ser convidado para escrever este livro pela prestigiada Fundação
Francisco Manuel dos Santos, fui alvo de uma experiência parecida. O gajo
responsável por estes livritos (note-se, livritos vendidos praticamente ao
preço do quilo da Amêijoa vietnamita, 3,15 euros, isto é quase dado) chegou-se
ao pé de mim e pronto, convidou-me a escrever uma merda qualquer, desde que
batesse nos comunistas. Como o Alentejo está cheio deles e a minha família é de
lá, não precisava de perder tempo com esses vícios do socialismo como ler
livros e exercer a crítica lógica.
Como definiria a experiência de escrever esta magnífica
obra, Alentejo Prometido?
Vou dar um exemplo. Sabe, ainda em tenra idade, no monte da
minha avó, um maltês pousou a pistola na mesa, e enquanto lhe eram servidos os
ovos com linguiça, eu, uma criança já irrequieta, considerei aquilo uma infâmia
e perguntei ao maltês se não tinha lido as obras completas de Toqueville. Ele
encolheu os ombros. Irado perante o esquerdismo evidente do gatuno, quis saber
se o mal-educado não tinha um Pingo Doce onde ir comprar os ovos e a linguiça.
Desculpe interromper, a esquerda é muitas vezes acusada de
considerar o Pingo Doce uma instituição perversa, e considerando que o
incentivo à criação intelectual deve ser controlado por instituições públicas,
com critérios de selecção públicos, critérios esses passíveis de revisão por
debate e mudança eleitoral.
Nem mais. Como vê, um absurdo, de outro modo, o público não
teria sido brindado com a obra em apreço. Não é para me gabar, mas temos aqui
um livro essencial como representação de segmentos da sociedade, descurados
pela produção cultural, nomeadamente, os jumentos, mas adiante. O maltês ali
estava, a mamar à conta da minha diligente e empreendedora família, quando
podia perfeitamente ter adquirido os ovos e a linguiça num magnífico
estabelecimento da excelente empresa Soares dos Santos. Mas não, bem pelo
contrário, veio incomodar a minha família com uma pistola, dando uns tiros, e
pousando a referida pistola em cima da mesa, num claro e inaceitável gesto de
terrorismo regional.
Bem, é como diz, Henrique, e isso não o impediu de alcançar
uma obra penetrante e arguta, sobre uma das regiões mais trágicas do país, o
Alentejo.
Não, de todo, até porque ao escrever, não costumo utilizar o
raciocínio lógico. Misturo umas memórias mais ou menos esfarrapadas de mau
cinema americano, leio duas ou três páginas daquele velhinho meio holandês, e
já um bocado tolinho, o José Rentes de Carvalho, passo a minha língua pela
banda magnética do cartão multibanco, e sai-me naturalmente esta capacidade de
provocar e combater os lugares comuns.
Fale-nos um pouco mais desta sua especialidade: a
provocação. O Alentejo do turismo e do neo-realismo não é o verdadeiro
Alentejo. Há toda uma verdade por revelar. No Programa da Sic Radical diz: «Os
meus avós (avôs) não tinham carinho pelos filhos porque não tinham a palavra que
afunilasse (e sublinho o afunilasse) o carinho, que é "criança"».
Esta teoria de palavras capazes de afunilar conceitos, neste caso, o carinho, é
algo que nestes últimos dias tem feito brado em algumas revistas de
linguística, das mais prestigiadas universidades norte-americanas. Um estudioso
chega a sugerir que a origem desta sua clarividente teoria, pode estar
relacionada com o facto de os Alentejanos usarem muito o funil, quer para
passar o azeite dos tonéis para os galheteiros, quer para passar o vinho dos
garrafões para as garrafas.
Não me parece, nunca vi nenhum alentejano a utilizar o
funil. A relação entre os conceitos e as palavras, no seio dos alentejanos, é
uma relação feita através da faca e da pistola, razão pela qual existe tão
pouca gente no Alentejo. E se pensar nisso, verá que é natural, as pessoas têm
medo e vão viver para locais onde a confiança é predominante, como Rio de Mouro
ou Almada, locais onde, em vez dos Malteses, os antepassados são decoradores de
interiores vegetarianos e adeptos de budismo.
Algumas pessoas, tomadas pela inveja, avançam uma outra
hipótese para a sua teoria do funil e da criança: a de os seus avós poderem
eventualmente ter conhecimento da palavra criança, mas não se sentirem
convidados a usá-la, diante de uma figura com a sua maturidade, mesmo quando
tinha 6 ou 7 anos, e já lutava pela liberdade das galinhas poderem estabelecer
o seu próprio sistema de saúde. Concorda?
Não concordo e vou explicar porquê. Essas pessoas devem ser
todas alentejanas. O alentejano é por natureza uma pessoa desconfiada. Pense no
cão, por exemplo, o rafeiro alentejano, ninguém fala nisso, mas é uma vergonha.
Se chegar a uma aldeia ou vila alentejana, verá um grupo de cães a caminhar na
diagonal, de um lado para o outro, em busca de um bocado de osso ou de uma
cadelita onde sossegar os instintos, sem que as cadelitas conheçam qualquer
latido para designar violação. São animais egoístas os cães alentejanos. Mas se
chegar a Arouca ou a Vila Nova de Gaia ou a Santa Comba Dão, verá os cães
reunidos em assembleia, desde rafeiros até galgos, a tocarem violino em
orquestras de câmara ou reunidos em Parlamento, de onde se conclui que as
escolas do norte do país, por estarem menos dependentes do socialismo do
Ministério da Educação, e por serem fruto da liberdade cívica e do fervor das
comunidades religiosas, até entre os cães conseguem estabelecer laços de
confiança e criatividade.
Segundo afirma, os laços de comunidade são fortes no Norte e
fraquíssimos no Sul.
Rigorosamente. No sul, como disse, predominaram sempre os
malteses, uma espécie de cowboys, bandidos e revolucionários. Uma espécie de
cruzamento entre Che Guevara, John Wayne, um cesto de coentros e umas calças de
ganga. Os malteses ameaçavam incendiar as colheitas dos proprietários e com
este repugnante ataque à propriedade privada, semeavam a violência, e por isso,
a desconfiança. Como toda a gente sabe, os malteses são os antepassados da
Mariana Mortágua. Só lhe falta ladrar.
Mas no norte, não existirá registo ou vestígio de violência
similar?
Nem pense, de todo. Conheço bem o norte, tenho um primo
maluco que fez a tropa em Chaves.
Mas em que dados históricos ou sociológicos se baseia?
Ora, não me diga que também é socialista. Baseio-me na minha
rica e paranóica experiência em casa dos meus familiares em Santiago do Cacém.
Mas deixo aqui mais uma prova irrefutável: já viu a quantidade de malucos no
Alentejo? A opção de semear sobreiros ou oliveiras, espaçados entre si, decorre
de uma intenção perversa. É para melhor se poderem enforcar em solidão, e com
absoluta desconfiança entre si. No norte, por exemplo, predomina o pinhal e
nalguns casos, o castanheiro, ou o carvalho. Em todo o caso, tudo árvores
altas, precisamente devido ao facto de as pessoas não gostarem de se suicidar.
No caso de se verem forçados a fazê-lo, as árvores estão todas juntinhas, o que
reforça os laços de confiança.
Mas diga-nos Henrique Raposo: o suicídio é ou não um fenómeno
natural no Alentejo?
É curiosa essa pergunta. Repare: ninguém contesta moralmente
um terramoto ou o nevoeiro.
Depende, no estádio da Choupana, na Madeira, contesta-se o
nevoeiro.
Está bem, nesse caso, sim, mas em geral, as coisas chatas
acontecem e pronto. O alentejano vê o suicídio como um fenómeno natural. Olha,
matou-se. O que é uma vergonha, as pessoas julgarem que podem agarrar numa
corda, enrolar um ramo de figueira, fazerem um nó, e enforcarem-se, num mundo
onde existem tantas maravilhas, como eu próprio, ou os livros do Pingo Doce. No
outro dia, pretendia ir a um café, numa aldeia da zona, algures no Alentejo, e
a senhora, olha para mim, com um ar de
alentejana e diz: está a ver aquele ajuntamento ali. Ele matou-se. E disse isto
como quem diz: eu sou do Porto ou do Benfica, ou mesmo, ofereceram-lhe um livro
do Henrique Raposo. Já viu bem? Isto não é admissível.
Há muitas pessoas que o consideram apenas um parvo, a quem
foi dado um incrível protagonismo, ou por razões comerciais, uma vez que a
raridade da sua estupidez atrai imenso público, ou simplesmente por similar
estupidez de quem o convidou a escrever, incentivando a sua falta de noção
perante o disparate, dando livre circulação à sua despreocupada ignorância e
olímpica burrice. O que diria a estas pessoas?
Sinceramente, diria que não passam de uma cambada de
socialistas e inimigos da liberdade de expressão, adeptos dos lugares comuns e
dessas banalidades, nomeadamente, a crítica esclarecida, a especialização, o
trabalho e conhecimento da literatura específica dos assuntos em apreço. Se
dermos demasiada importância a essas pessoas, corremos o risco de acabar
encurralados numa sociedade totalitária, controlada por alentejanos, sem venda
retalho e sem lucros, nem Fundações, sem incentivos privados à criatividade dos
verdadeiros intelectuais, num país tão necessitado dos meus conhecimentos.
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