Há exercícios mais estúpidos do que outros. A título de exemplo, os alongamentos nas aulas de educação física - braços esticados a tocar o chão, contra uma régua de madeira, enquanto os joelhos deviam permanecer hirtos e as pernas rectilíneas, no momento em que a espinha, dobrada como uma morcela ao sol, guinchava pedidos de clemência disfarçados de gritinhos juvenis -exercícios que torturavam a consciência dos colegiais em níveis inimagináveis num regime democrático. Porém, que dizer do exercício jornalístico-literário entre António Lobo Antunes e Gonçalo M. Tavares? A entrevista não chega a ser ridícula porque os autores não merecem as toneladas de xistes que facilmente podiam ser destilados daquela gordurosa excrescência mediática onde Tavares, adestrado na exegese literária de cerca de 2500 autores de referência, lambe as botas, com toda a solenidade olímpica, a um bom homem e genial escritor, cuja velhice fez perder o rigor no desespero, essa característica imortal da solidão. Enquanto se encomenda à eternidade, implorando o reconhecimento na galeria das transformações estilísticas - o estilete era o ferro com que se marcavam as tábuas de barro - vai decrescendo na capacidade de silenciar o que não importa. Se apenas agora falo do assunto isso deve-se ao grande respeito, inegavelmente devido, pelos poentes melancólicos da minha adolescência, desfeitos contras as páginas epifânicas de «Fado Alexandrino» um dos monumentos da arte portuguesa do século XX. Já nessa altura os cavalos faziam sombra no mar. Em todo o caso, porque razão deveriam eles (cavalos e poentes) ser descritos tão longamente, até a repetição ser como o ruído permanente de uma auto-estrada, mesmo que ela nos conduza ao paraíso? «Lembro-me de falar à editora de um rapaz com uma grande margem de progressão» O problema é que «margem de progressão» é um efeito discursivo a que sempre votei o mais profundo desprezo. Isto porque, estando desde sempre no fim da margem, não houve nunca por onde progredir.
Sem comentários:
Enviar um comentário